sábado, 31 de outubro de 2015

Diálogos Sobre a Religião - Ateu e Reformado debatem moral e doutrina da salvação

O seguinte diálogo é inspirado em várias conversas que tivemos ou debates que vimos. Não se dirige a nenhum de nossos amigos e colegas ateus em particular, mas aos que têm esses argumentos e que, inclusive, já usaram contra nós. Foram vários. Então, não se sinta, caso você se lembre de termos conversado algumas partes desse diálogo, como se estivesse recebendo uma indireta. As mesmas coisas foram conversadas com outras pessoas.
Outra ressalva importante é explicar a preferência por ‘REFORMADO’ ao invés de cristão’. Na verdade não pretendemos fazer grandes explicações aqui, pois já a começamos noutro artigo[1]. Em suma, estamos usando o termo na presunção de que a fé reformada é a autêntica e mais exata representação da fé bíblica. Mas é claro que os argumentos – a maioria, pelo menos, senão todos – aqui esboçados poderia ser usado por outros seguimentos cristãos.



Numa situação qualquer em que um bom cristão, de confissão reformada, se encontra com um amigo ateu e, por qualquer motivo que levaria a uma discussão sobre religião - e eles existem aos montes - começa-se a seguinte discussão:

ATEU - Sabe, meu amigo, há algo que realmente me incomoda nos religiosos...
REFORMADO - Puxa, eu não responderia pelos 'religiosos', mas, tudo bem, diga-me o que é...
ATEU - Eles se acham melhores do que as demais pessoas por serem religiosas, mas na verdade o fato de serem religiosas as fazem, na verdade, piores...
REFORMADO - Como assim? Refere-te a questões históricas?
ATEU - Não, não! Bom, o que eu quero dizer é que, eu, como ateu, sou melhor do que vocês quando faço algo de bom.
REFORMADO - Sério? Como assim?
ATEU - Quando vocês fazem algo de bom o fazem porque querem ir para o céu. Com todo respeito, mas isso é ser mercenário. Nós, ateus, fazemos o bem porque isso é o certo.
REFORMADO - Mas se alguém não quiser fazer o certo ele é mau?
ATEU - Certamente.
REFORMADO - Sob qual critério?
ATEU - oras, ele não estará fazendo o certo.
REFORMADO - E quem falou que ele deve fazer?
ATEU - Mas o que é isso? Está pensando como se fosse um ateu!
REFORMADO - Estou pensando como um ateu mesmo, para mostrar que sua visão de mundo não comporta essas suas afirmações.
ATEU - Então, quer dizer que só quem é crente pode ser bom?
REFORMADO - Bom, 'ser bom' é um conceito difícil. É claro que você pode fazer algo bom. Ninguém duvida disso. Ainda assim teríamos que investigar suas intenções...
ATEU - Justamente! As intenções é que estão em questão...
REFORMADO - Por que alguém deveria fazer o que é certo?
ATEU - Oras, há várias teorias para isso. Gosto bastante daquelas que dizem que devemos fazer o bem para transformar o mundo num lugar melhor...
REFORMADO - Então, no final, é para você mesmo se beneficiar?
ATEU - Não, não. Fazemos porque queremos fazer o bem.
REFORMADO - E se alguém não quiser?
ATEU - Ela estará se prejudicando.
REFORMADO - Sempre?
ATEU - Acho que sim.
REFORMADO - Parece que você está flertando com a ideia de contrato-social, não?
ATEU - Bom, em certa medida, sim, é uma boa justificativa para a ação moral. É racional. Mas esse não é o ponto. Eu faço o bem porque quero e não por qualquer outro interesse.
REFORMADO - Justamente, não é o ponto. O ponto é que vocês não poderiam dizer que alguém que é poderoso o suficiente para ficar impune e que consiga sobreviver por seus poderes tenha que se submeter às regras da sociedade.
ATEU - Claro que tem!
REFORMADO - Por quê?
ATEU - Bom... Ele ficará bem consigo mesmo...
REFORMADO - Então é, novamente, de egoísmo que te acuso.
ATEU - Tudo bem, que seja, qual o problema disso?
REFORMADO - Ser egoísta não é ser mau?
ATEU - Com quais fundamentos afirma isso? Acho que não há problemas ser egoísta...
REFORMADO - Assim como o poderoso impune não vê problemas em fazer as coisas terríveis que faz... A questão é justamente essa. Você move-se sem padrão algum.
ATEU - Movo-me sob o padrão da utilidade!
REFORMADO - E como impedirá o poderoso? 

ATEU - Quer dizer, então, que é correto fazer o bem só para ir para o céu? Ou deixar de fazer o que é mau para não ir para o inferno?
REFORMADO - Bom, em certo sentido, não há problema algum em perseguir o céu...
ATEU - Como não?!
REFORMADO - Pois veja. Existem recompensas naturais e legítimas para um ato, ao passo que existem as contingentes e ilegítimas...
ATEU - Certo.
REFORMADO - Enriquecer-se não é uma recompensa para o amor e se alguém se casa com alguém para enriquecer-se a consideraríamos um mercenário.
ATEU - Sem dúvidas!
REFORMADO - Mas o casamento não é uma recompensa merecida para o amor?
ATEU - Bom, sim... mas...
REFORMADO - Percebo que tal argumento não pareceu convencê-lo, não é mesmo?
ATEU - Não... Bom, veja, é um bom argumento... mas...
REFORMADO - Permita-me completar o raciocínio.
ATEU - Vá em frente.
REFORMADO - Atenta-te para isso. Acreditamos que dentre os anseios e desejos do nosso coração, de nossa alma, está aquele de contemplação da mais pura beleza e do mais sumo bem: Deus. Fomos feitos para adorá-lo. Quando nos convertemos passamos a mirá-lo no horizonte de nossa jornada...
ATEU - Mas o que isso tem que ver com fazer o bem para ir para o céu?
REFORMADO - Aí é que está a grande questão! A fé bíblica é um pouco diferente daquilo que você deve ter ouvido como cristianismo...
ATEU - Como assim?
REFORMADO - Há uma resposta bíblica que muda a perspectiva sobre esse assunto. Paulo, por exemplo, ensina claramente que não iremos para o céu por sermos bonzinhos...
ATEU - Então não importa o que façamos, iremos para o céu?
REFORMADO - Não é isso que estou falando.
ATEU - Ah, então te interrompi. Agora acho que as coisas estão ficando ruins para você... Vou deixar que se enforque. Continue.
REFORMADO - Veremos... Prossigamos. Eu dizia que não é o fato de sermos bonzinhos justamente pelo fato de não podermos ser bonzinhos o suficiente para ir finalmente ser salvo da Ira final de Deus.
ATEU - Ira de Deus? Que conceito antiquado!
REFORMADO - Bom, vamos discutir esse conceito. Mas você não pode continuar me interrompendo, pois levanta uma infinidade de questões às quais não terminei de responder.
ATEU - É que parece que está enrolando...
REFORMADO - Oras, mas de onde tirou que as respostas têm que ser tão rápidas assim?
ATEU- Tudo bem, vá lá, estou tumultuando. Prossiga. É que esse papo de Bíblia me dá náuseas...
REFORMADO - Eu sei que dá. Também tenho imenso desgosto com vários de teus posicionamentos. Mas isso não me impede de discutir contigo, não é mesmo?
ATEU - Mas a maioria dos crentes não é assim...
REFORMADO - Pior para eles. E, por favor, é melhor me identificar como um cristão reformado do que com um 'mero crente', pois o termo já está bem desgastado por essas terras...
ATEU - Como assim?
REFORMADO - Esqueça! Depois conversaremos sobre isso. Por enquanto fiquemos com o assunto soteriológico.
ATEU - 'Soterio' o que?
REFORMADO - Sobre a doutrina bíblica da salvação.
ATEU - Perfeitamente. Siga adiante.
REFORMADO - Bom, eu dizia que não podemos ser bons o suficiente para ir para o céu. Vamos colocar como 'ir para o céu', embora esse conceito também tenha que ser trabalhado.
ATEU - Tudo bem. É o suficiente. Mas, o que quer dizer com 'ser bom o suficiente'? Quanto é o suficiente?
REFORMADO - Ser perfeito.
ATEU - Oras, mas isso é impossível! Deus não poderia exigir uma coisa dessas... isso o torna mau!
REFORMADO - Pelo contrário, meu caro, se ele não exigir algo nesse nível é que ele seria mau. Aliás, isso já irá abarcar aquele assunto sobre a Ira de Deus que falávamos...
ATEU - Meu amigo, isso está muito estranho. Como é que um ser que se Ira e que exige que sejamos perfeitos pode ser bom?
REFORMADO - Verás que concordas comigo. Um ser que é absolutamente bom, justo e santo poderia permitir que o mal fique impune?
ATEU - Como assim? Ele não é misericordioso? Ser misericordioso[2] não é um dos frutos do seu amor, como vocês pregam?
REFORMADO - É mais uma das confusões que vocês fazem, rejeitando um espantalho ao invés da fé cristã.
ATEU - Pois, então, por obséquio, esclareça-me essa questão.
REFORMADO - Com enorme prazer! É bem verdade que Deus é amor e isso o torna misericordioso. Mas para exercer essa misericórdia ele não pode ir contra seus demais atributos. Ele não pode ser mau para ser misericordioso.
ATEU - Hum... acho que começo a compreender. Mas como ele pode ser misericordioso?
REFORMADO - Bom, firmemos, primeiro, que ele é Todo-Bom, correto?
ATEU - Certo. Esse é, pelo menos, o conceito cristão a respeito de Deus.
REFORMADO - Que seja. Acreditamos que toda injustiça e mal cometidos impunemente durante a história da humanidade será, finalmente, julgado no dia do Juízo Final. E lá, pois, Deus não poderá deixar-nos impunes por nossos erros.
ATEU - Tudo bem, vamos ver até onde esse raciocínio dá. Mas já parece estar me enrolando nesse papo de teólogo...
REFORMADO - Ha-ha-ha! Ok, mas vou continuar no papo de teólogo...
ATEU - Siga.
REFORMADO - Bom, uma vez que não podemos, pois, ser bons o suficiente, procuramos uma justiça que não vem de nós. É aí que entra nossa gratidão por Jesus Cristo.
ATEU - Ei! Está me evangelizando?! Queres que eu me torne cristão?
REFORMADO - Oxalá se você se torna-se cristão! É meu desejo declarado desde sempre. Mas, agora, estou expondo minha fé que, em termos filosóficos, é uma exposição da minha cosmovisão no campo da ética e no 'teleológico'.
ATEU - Tudo bem, ouvirei mais um pouco porque você é um cara legal e estudado. No meio de toda essa bobeira deve ter algum conceito interessante...
REFORMADO - ... Bom, vamos lá. Cristo. Ele vai para a cruz para antecipar as punições que teríamos que pagar no Juízo Final, que são, na verdade, altas demais!
ATEU - Hum... certo. Mas aí eu tenho outro problema. Então alguém que é um crápula durante toda a sua vida pode, no final, se arrepender e ir para o céu?
REFORMADO - Sim, mas...
ATEU - Isso é injusto! Deus estaria sendo mau até mesmo sob teus padrões, amigo! Onde está sua ira? O que esse 'malandro-aposentado' perdeu?
REFORMADO - Aí é que está, meu bom amigo! Você não está olhando para o todo. Para começo de conversa, esse homem terá uma grande dor em sua alma pelo que fez. Mesmo que saiba estar perdoado por Deus, sofrerá com as dores na alma pelo resto de sua vida, até que renasça e todas as lágrimas sejam enxugadas.
ATEU - Isso não basta!
REFORMADO - Não mesmo. Você está coberto de razão. É preciso um castigo severo para os seus crimes. Certamente muito mais severo do que nós, com nossas percepções morais míopes, podemos conceber.
ATEU - Claro! Mas, espere, aonde quer chegar? Purgatório?
REFORMADO - Não, não. É certo que não. Essa não é uma doutrina bíblica...
ATEU - Ah, verdade, você não é católico, não é...
REFORMADO - Isso. Reformado. Não se lembra?
ATEU - Ok, mas, e então? Deve esse homem fazer coisas boas para pagar pelas más?
REFORMADO - Que ele deve fazer coisas boas isso não há dúvidas. Que ele deve tentar reparar os erros que cometeu, também não discordo. Mas que as coisas boas cobrem as ruins não há qualquer fundamento bíblico.
ATEU - Não?
REFORMADO - Não. O mau demanda punição e o bem recompensas. Mas a recompensa do bem não é a retirada da punição. Esse conceito é estranho à ontologia moral bíblica. E, instintivamente sabemos disso!
ATEU - Interessante... Mas, o elucide esse 'instintivamente' para mim. Não estou certo de que concordo com isso.
REFORMADO - Bom, embora nosso senso moral possa estar embotado em grande medida, nas faltas mais graves conseguimos perceber com maior clareza o que estou dizendo. Se alguém estuprasse tua mãe, irmã, esposa ou filha você ficaria indignado. Algo muito ruim foi feito. Você sabe que isso demanda punição. Se o estuprador tornar-se um monge não irá satisfazer tua demanda por justiça...
ATEU - É verdade... Mas, então, não estou te entendendo! Esse cara pode ser salvo ou não?
REFORMADO - O que eu disse que foge da sua perspectiva é que há uma punição infinitamente mais severa do que poderíamos imaginar: o próprio Deus resolve encarnar-se, tornar-se homem para sofrer pelos homens.
ATEU - Então o flagelo divino recai sobre Cristo?
REFORMADO - Justamente. E, não, não é um mero flagelo, mas toda a Ira final de Deus contra o pecado! É algo terrível. Muito pior quando consideramos a natureza de quem padece do furor divino: Cristo, o homem-Deus, totalmente santo e justo.
ATEU - Mas não foi injusto que alguém tão bom assim sofresse as injustiças dos outros?
REFORMADO - Certamente seria injusto se ele fosse obrigado a fazer isso. Mas ele voluntariamente resolveu sofrer por nós.
ATEU - Ok, caro amigo reformado. Isso parece fazer sentido. Mas e quanto à questão inicial?
REFORMADO - Bem lembrado! Bom, como eu falava, nós, os autênticos cristãos, definidos assim segundo a própria Bíblia, não fazemos o bem para ir para o céu. Nós já temos por garantido o céu. Nós fazemos o que é certo justamente por sermos cidadãos celestes por antecipação...
ATEU - Como assim? Como é que têm essa certeza? 
REFORMADO - É preciso crer em Cristo...
ATEU - Como assim? É só dizer que se acredita e fim? É como um passe órfico para ser dito no dia do Juízo Final?
REFORMADO - Não mesmo, meu amigo. Jesus disse que naquele dia alguns iriam regozijar-se na sua vinda, mas ele lhes dirá: eu não conheço vocês!
ATEU - Uau! Que pesado...
REFORMADO - Certamente, terrível! Mas na mesma passagem em que isso é dito se diz que Jesus os rejeitará porque, embora o tenham como salvador, não o têm, de fato, como 'Senhor'. Isto é, eles se submetem a Cristo enquanto aquele que os livrará da ira vindoura. Mas não o reconhecem como Senhor e Deus.
ATEU - Então é preciso acreditar que ele é Salvador, Senhor e Deus?
REFORMADO - Basicamente sim.
ATEU - Ok, se eu disser que acredito nisso, então estou garantido?
REFORMADO - Não, não. Isso é uma confissão do fundo do coração.
ATEU - Que, no caso, só Deus vê... Então um crápula, um facínora, pode, no fundo, acreditar nisso...
REFORMADO - Não, cara, você está entendendo errado, mais uma vez...
ATEU - Oras, o que me falta entender?
REFORMADO - Bom, na verdade falta-te muita coisa no que diz respeito à fé cristã, mas para nossos propósitos é importante que compreenda a dinâmica da fé.
ATEU - Ok, termina de explicar isso que tenho que ir.
REFORMADO - Pois bem, fechemos, pois, nisso.
ATEU - Não que tenhas me convencido a tornar-me um cristão. Só está me explicando melhor teu ponto de vista...
REFORMADO - Bom, é uma pena que não, mas, seja como for, exponho-te o que não é meu, mas do próprio Deus conforme ele revelou.
ATEU - Segundo tu crês...
REFORMADO - Pois bem, terminemos... ou então levantaremos outra discussão!
ATEU - Ha-ha-ha. É verdade. Termina-me de explicar, então, como a Bíblia resolve essa questão.
REFORMADO - Pois bem, crer em Cristo significa acreditar em tudo que as Escrituras dizem sobre ele. Isso implica em acreditar na dignidade de sua pessoa, na nossa culpabilidade, e no grande favor feito por Deus na Cruz. Não é possível observar a tudo isso de forma apática. Quem não tiver sua consciência afetada por isso é por não acreditar que Jesus e realmente Deus, e que na cruz ele padeceu infinita dor que cabia a nós por nossos erros. Só aí já se demanda, a partir da crença, um tipo de atitude diferente.
ATEU - Então quem acredita no Jesus da Bíblia...
REFORMADO - Que é o Jesus da História!
ATEU - Tudo bem, mas eu usei 'da Bíblia' para diferenciar dos conceitos errados que as pessoas têm sobre Jesus, conforme você disse.
REFORMADO - Ah, perfeito! Ótimo, perdão. Continue.
ATEU - Bom, então, como eu estava falando, quem acreditar nesse Jesus também terá acreditado que seus erros são tão maus que fizeram com que Jesus tenha morrido.
REFORMADO - Perfeitamente! Mas, como se isso não bastasse, e o pecado (o erro moral) seja um ultraje ao sacrifício de Cristo, reconhece-se, com a divindade de Cristo, que ele é, portanto, Senhor. Isso quer dizer que devemos lhe obedecer se de fato acreditamos em Jesus. E não só isso, como acreditar que sua vontade é boa, perfeita e agradável mesmo quando não a compreendemos como possuindo esses atributos, de modo a sempre buscar obedecê-lo.
ATEU - Bom, então se alguém diz que acredita em Jesus Cristo, mas não tem uma vida correta, então não é cristão coisíssima nenhuma!
REFORMADO - Exatamente.
ATEU - Então muitos cristãos não irão para o céu.
REFORMADO - É o que o próprio Cristo disse copiosamente.
ATEU - Bom, mas isso me faz pensar numa série de outras questões... infelizmente não há mais tempo para mim. Vou seguindo adiante. Foi bom conversar com você! Qualquer dia voltaremos para esses assuntos de teologia e Bíblia. São até interessantes. Quem me dera se todos os cristãos pensassem como você...
REFORMADO - Vá lá, meu amigo. Até a próxima.

 PS: As duas imagens no decorrer do texto foram tiradas do facebook da ATEA, para mostrar que são ataques reais feitos à fé cristã, e não coisas da cabeça do autor do diálogo.


[1] Referimos-nos a este artigo: Afinal, quem REALMENTE são os evangélicos?
[2] Para ampliar a discussão sobre esse ponto, veja: Prolegômena à Predestinação: uma questão de justiça

segunda-feira, 19 de outubro de 2015

Como Ser Mau Para a Esquerda - o caso de Mauro Iasi

As coisas estão muito malucas mesmo! Ou não estamos entendendo nada, ou o nível de hipocrisia da esquerda brasileira beira à insanidade. Um pequeno artigo teve de ser rabiscado às pressas para registrar o que facilmente seria descrido se contássemos sem as devidas provas. Do que estamos falando? Do escândalo das palavras de ódio e ameaça do professor Mauro Iasi, da Universidade Federal do Rio de Janeiro. Para quem não viu o vídeo, ei-lo:



Aquilo que sempre tem sido dito pelos conservadores e liberais está aí, escancarado (como se precisássemos de mais provas)*¹. Como outrora dito por Reinaldo de Azevedo, a diferença dos crimes cometidos em favor de uma política liberal e os crimes da esquerda se diferem nalgo singular: uma iniciativa particular gerou aqueles, ao passo que estes são uma categoria de pensamento. Ou seja, na filosofia de muitos grupos de esquerda a eliminação daquele que discorda está dentro do script!

Mas aí alguém pensaria: não, isso é um exagero pois, afinal, foi um caso isolado e certamente a todos manifestariam uma nota de repúdio às escabrosas declarações. Não, não é isso que acontece. Ele não só recebe apoio*² como, em tal ato, acusam as pessoas de fazerem exatamente o que o dito cujo propôs fazer: violência. É o cúmulo da hipocrisia!
O quadro é esse: ele diz aberta e publicamente que com conservadores não deve haver diálogo, mas luta. Se formos bonzinhos teremos um bom paredão, uma bela bala e uma bela cova (o que será que acontecerá se formos um inimigo político declarado?). Então alguns conservadores, ameaçados, resolvem revidar. Alguns, dizem, ameaçaram Iasi. Parece que até ameaçaram-no de... morte. Mas, oras, não é justamente o que ele propôs para esses mesmos que o ameaçam de morte? Isso foi
tolerância? Só há intolerância, claro, quando se ameaça de morte alguém da esquerda que te ameaçou de morte. Se você ameaçar algum 'miserável reacionário' estará lutando pela democracia e guiando a sociedade para um patamar de justiça 'nunca antes visto nesse país'. É com essa política maravilhosa que vimos o grande progresso da humanidade nos paredões cubanos, na União Soviética, na Alemanhã... mas, espere, fascismo não pode ser contado. É coisa 'de direita'. Promove o fim da liberdade, que é um dos valores mais caros ao conservador e ao liberal, mas mesmo assim, é coisa de direita.

E falando em liberdade, a ANDES tem a cara de pau de falar que são a favor da liberdade de expressão e do livre transitar de ideias*³. Mas quem quer que alguma atitude seja tomada contra um criminoso que incita à violência está propondo, na mente maluca dessa estirpe, algum tipo de opressão. Liberdade de expressão não quer dizer que podemos falar o que bem entendermos. Não podemos difamar alguém de forma gratuita. Espalhar mentiras - principalmente danosas à moral de alguém - pode ser punido criminalmente. Se alguém faz ameaças públicas, então, é evidente que está ferindo outros princípios, paralelamente sustentados, na democracia, com a liberdade de expressão. A liberdade é cerceada - já diziam nossos pais - pela liberdade do outro. Mas, na cabeça desses patifes algo como o 'direito de ir e vir' seria interpretado como o direito - deles (e não nós! Jamais!) - de entrarem em nossas propriedades quando bem entendessem. Aliás, diriam, 'que propriedades?'...

Com a famosa tática de acusar no outro o que se faz, sem nem enrubescer o rosto, temos um exemplo óbvio de que as coisas estão indo de mal a pior. A estratégia é nítida, clara: diga, caro militante esquerdista, que fazemos o que você fez, faz e/ou fará e tornar-se-á invisível para executar seus planos. E isso não é ser mau. O que é 'ser mau' para a esquerda é igualmente fácil definir: basta não ser de esquerda.


_____________

* Goste você ou não do Olavo, eis uma lista de citações espantosas que ele transcreve num de seus artigos (que pode ser lido aqui). Isso para não falar do que Pondé sempre tem apontado e subjaz ao discurso de Iasi, a saber, o monopólio da virtude ostentado pela Esquerda. O conservador diz-se ser, apesar de conservador, uma boa pessoa... Mas como assim? Mais uma vez o imaginário canhoto descamba em delírios de virtude que, dado o atual estado patente de suas mentes de psicopata beira à patologia registrada com o nome de megalomania, afinal, se um bando de assassinos se julgam a vanguarda da moralidade e do bem, que outra loucura poderíamos identificar?
* Veja a nota de apoio ao professor Iasi pela ANDES -SN aqui e aqui.
* Fora a velha ladainha de que ser conservador é apoiar o regime militar ou que o regime militar sequestrou e matou milhares de brasileiros, jovens que lutavam pela liberdade, pessoas de bem... e não bandidos, em cifras muitíssimo menores, que não tinham qualquer intenção democrática.

quarta-feira, 12 de agosto de 2015

Sobre os Dons - Conheça a Perspectiva Reformada sobre o Tema



Este é mais um artigo de recomendações. Vou listar aqui alguns bons vídeos de reformados sensatos falando sobre o que pensamos sobre os dons espirituais e a obra do Espirito Santo no que diz respeito à condução do trabalho eclesiástico. Isso me poupará o trabalho de correr, todas as vezes, à mesma lista de vídeos todas as vezes que tenho que indicar algo para um amigo e irmão que me pede tal tipo de esclarecimento. Alguma coisinha já fora exposta, outrora, no debate com o Júlio Severo, que colocamos aqui (veja que são três partes).

Primeiro, uma série do Reverendo Heber Jr.:

Dons Espirituais - Introdução
Parte 1
Parte 2
Parte 3
Parte 4

Em seguida, vejam algumas exposições do Reverendo Leandro Lima:

Os Dons do Espírito (Parte 1)
Os Dons do Espírito (Parte 2)
O que a Bíblia diz sobre Dom de Línguas (Hangout)
O que a Bíblia diz sobre Dom de Cura (Hangout)

Temos também um doutor em Antigo Testamento falando sobre os dons do Espírito no Antigo Testamento. Falo do Reverendo Daniel Santos:

Manifestações do Espírito no Antigo Testamento
O Espírito Santo Concedendo Dons no Antigo Testamento

O seminário presbiteriano Ji-Paraná tem vídeos a esse respeito também:

Línguas Deformadas - Rev. Ewerton Tokashiki
Cessacionismo - Rev. Alessandro Santarelli
Provando os Espíritos - Rev. Zilmar Hotti
A Insensatez dos Profetas Falíveis - Rev. Wagner Nogueira
A Verdadeira Obra do Espírito Santo - Rev. Joares Morais
Falsas Curas, Falsas Esperanças - Rev. Evanderson Cunha
Apóstolos Entre Nós - Rev. Luciano M. Amorim

Finalmente, dentre os brasileiros, o atual vice-presidente da Ipb, Reverendo Augustus Nicodemus:

O Batismo com o Espírito Santo (Parte 1)
O Batismo com o Espírito Santo (Parte 2)
O que o Espírito Santo fazia antes do Pentecostes?
Exposição em 1 Coríntios 14
O que é Profecia? Existe Hoje?
Pentecostes: ontem e hoje

Agora, o famigerado congresso Fogo Estranho, onde figuras reformadas famosas fizeram exposições úteis para o interessado no assunto:

Provando os Espíritos - John MacArthur Jr.
As críticas de Calino aos calvinistas pentecostais - Steve Lawson
Cessacionismo - Tom Pennington
Depreciando o Pentecostes - R. C. Sproul
Uma Cura Mais Profunda - Joni Tada

Com tudo isso, qualquer interessado terá um material robusto para entender como os reformados encaram a questão, apesar das diferenças acidentais entre os vários pensadores apresentados.




quinta-feira, 9 de julho de 2015

Prolegômena à Predestinação - uma questão de justiça




"Ora, a excelência, beleza e perfeição de cada ser vivo, objeto inanimado ou ação humana depende exclusivamente da utilidade para que o destinou a natureza ou o artífice" (Platão, Livro X da República).

Prolegômena é aquilo que se discute antecipadamente. É a discussão que deve ser feita - mas geralmente não o é - antes de entrarmos em outros pontos. Supostamente há pontos pacíficos quando se vai discutir vários temas. Acreditamos que aquele com quem estamos a debater assume algumas coisas que nós de antemão achamos óbvias demais para serem discutidas. No entanto, um levantamento de pressupostos que regem as colocações demonstrará que, não raro, há pontos de discordância que impediriam completamente os contendores de chegarem a um acordo.
Com esse pequeno texto, pretendemos explorar alguns itens prolegomenais em relação à discussão sobre a predestinação, eleição e afins, contidos nas doutrinas da graça* conforme expõem os teólogos protestantes reformados - os quais nos parecem mais próximos das Escrituras. Particularmente, estamos interessados em considerar o conceito de justiça que é trazido à baila nessas discussões de forma, amiúde, desorganizada e confusa. Basicamente, questiona-se se seria justo que Deus elegesse algumas pessoas para serem salvas e outras não. Nossa tese é de que é perfeitamente justo que Deus faça tal escolha.

Foi Voltaire quem observou que para discutirmos adequadamente temos que definir os nossos termos, o que já consiste, por si, em uma tarefa prolegomenal. Isso é uma forma de evitar a falácia da equivocação, que consiste em discutir com conotações distintas para um mesmo termo. É marca distinta de um bom pensador e de uma boa discussão que as coisas fiquem de antemão claras. Ao acompanharmos as discussões socráticas veremos da parte do sábio ateniense justamente o desejo de definições precisas para evitar confusão - o que, com frequência, colocava o próprio adversário em confusão, pois esse fora para a discussão sem pensar muito bem nas palavras que usava.
Queremos entender, pois, o que significa 'justiça'. Esse é o termo-chave da discussão. Acreditamos que podemos defini-la como algo nos seguintes termos: 'é ter cada um o que lhe é de direito', ou, 'cada um ter o que é adequadamente seu'. Quem já leu a República sabe como é difícil uma definição precisa, embora 'intuitivamente' arranhemos o conceito. Supomos suficiente definir tal como o fizemos.

A questão que se segue é a de saber o que é devido a cada um, ou seja, o que é de direito. O direito de algo ou alguém é determinado por seu valor ontológico, i. é., o valor intrínseco que a coisa tem segundo seu próprio ser. Entretanto, há algo assim? Valor intrínseco?
O valor de um determinado artefato criado por um homem está determinado por ele ao criar e estabelecer seu objetivo. E mesmo as coisas que ele não cria ganham seu valor segundo os fins para os quais ele percebe. Um homem pode considerar um violão extremamente valoroso na medida em que aprecia a música e, principalmente, aquela produzida pelo violão. Mas um cão ou gato não terá o mesmo apreço pelo instrumento, principalmente se não houver quem o toque - se é que animais podem verdadeiramente apreciar uma música. No máximo, servir-lhes-á para depositar alguma coisa, ou para afiar suas unhas. Portanto, percebemos que o valor das coisas é determinado de forma subjetiva. É preciso um referencial para que haja a determinação do valor.
Pois bem, temos que decidir de antemão se nosso referencial será antropocêntrico ou teocêntrico. Se tomarmos o homem como a medida de todas as coisas, teremos uma avaliação valorativa, e se tomarmos Deus, outra.
Estamos percebendo a que rumo o argumento está levando? Quem é que determina o valor do homem? Se ele é determinado pelo próprio homem, temos uma situação distinta daquela em que Deus é quem o determina. Esse é o ponto nevrálgico. Podemos falar que todas as coisas têm valor segundo o estabelece a subjetividade humana. Mas não seríamos indelicados se perguntássemos sobre o valor do próprio homem. É engraçado ver como naturalistas 'rebolam' para tentar dar algum valor distinto para um conjunto determinado de átomos dispostos de uma forma específica e não de outra. O homem não é mais do que isso nesse tipo de cosmovisão. E o valor que ele dá às coisas é relativo. E daí se as coisas têm esses valores para o homem?
Sem o homem poderíamos pensar no valor das coisas para manter o ecossistema. Mas, e daí? Por que o ecossistema deveria ser mantido? Alguém poderia responder imediatamente que seria para manter a vida na terra. Mas por que manter a vida? Ela nem mesmo é compreendida de forma 'anímica' pelo naturalista. Uma cosmovisão naturalista não pode dar um significado essencial para a realidade. Um cristão que toma o homem como referência para o valor das coisas é um incoerente que anda de mãos dadas com naturalistas. Um protestante, então, nesse caminho, chama para banquetear consigo Pelágio, João Cassiano e toda a corja que se segue.

Agora podemos rumar para a situação oposta. Deus determinando o valor das coisas. Para começar, ele está numa situação singular e muito superior à do homem para determinar o valor das coisas. Antes de mais nada, na cosmovisão cristã, ele é quem cria 'ex nihilo' tudo o que há. Cada parte do que existe além dele é engendrado, formulado, cogitado e executado por seu desejo. Portanto, o valor das coisas é definido segundo os objetivos que Deus tem para com tudo. Aí está o valor absoluto das coisas. Elas têm valor intrínseco por conta de seu lugar na criação.
Segue-se que é de direito que Deus dê ao homem o que lhe é cabível segundo o valor que Deus deu na execução de seus planos para cada coisa. Se o valor das coisas é dado por Deus, cabe a Ele dar a cada um o que bem entender segundo lhe parecer viável.

Não podemos encerrar esse artigo sem uma última formulação. Um ser racional age, na medida em que age racional e inteligentemente, com fins. Ele tem planos. Julgamos a integridade de seus planos e a competência do logos em executar seus planos. Um homem ao fazer algo tem, consciente ou inconscientemente, planos. Na medida em que ele conhece mais a si mesmo, mais consciente de seus objetivos ele está. Na medida em que é mais sábio e bom, objetivos mais nobres e sensatos ele tem, bem como os meios para alcançá-los. Apliquemos o raciocínio a Deus e teremos alguém que age com fins plenamente conscientes e estabelecidos, totalmente nobres e sensatos. Portanto, quando Deus criou cada coisa, inclusive cada homem, tinha uma pauta, um objetivo em mente.
E qual objetivo é esse? Com Charles Hodge aprendemos o que viria a ver novamente em John Piper: que Deus não pode ter outro objetivo que não ele mesmo como alvo final, último, derradeiro para as coisas. Quando ele vai criar só pode haver um objetivo sumamente nobre, santo e justo que é enaltecer aquilo que é mais santo, belo, nobre e bom: ele mesmo. Ele age, pois, em consonância com o que Paulo diz na epístola aos Romanos, para a sua glória, pois 'por ele, para ele e por meio dele são todas as coisas. A ele, pois, a glória eternamente. Amém!'.
Na mesma epístola, no nono capítulo, o apóstolo Paulo diz que Deus criou os eleitos para enaltecer sua misericórdia e os ímpios para enaltecer sua santidade, justiça e severidade para com o mal, o que implica ser extremamente bom. Paul Helm, certa feita, notou que se fosse injusto que Deus não salvasse alguns homens, então salvá-los seria questão de dívida, e não de misericórdia. Deus os salva segundo seu propósito final de glorificar a si mesmo em suas várias perfeições.

Portanto, é mais do que justo, nobre e santo que Deus eleja quantos ele quiser para a sua inteira glória, bem como pretira, igualmente, a quantos lhe aprouver. Este é o soberano Deus para quem nos dobramos em reverente adoração!

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* Notar que não iremos discutir as demais doutrinas da graça que são indissociáveis da eleição, como justificação objetiva e subjetiva, chamado externo, regeneração, santificação, adoção, ressurreição e glorificação.


segunda-feira, 8 de junho de 2015

Afinal, quem REALMENTE são "os evangélicos"?



Alguns estimados amigos e irmãos apreciaram um texto com a graça "Afinal, quem são 'os evangélicos'?", do jornalista Ricardo Alexandre. O título é interessante e, para todo bom cristão, há um desejo muito grande de verem-se apartados, inclusive no 'imaginário popular', de vários charlatões e reconhecidos malfeitores que se valem da religião para promoverem seus interesses e a tornam deplorável para o olhar do mais vil secularizado hedonista. Assustou-nos o fato de o texto estar na Carta Capital, nada afeiçoada à confissão cristã. A junção desses elementos despertou-nos à leitura. Escrita agradável e bem desenvolvida ['muito distante das que se veem nos textos deste humilde escritor que vos fala', destacariam alguns que inclusive vieram nos falar pessoalmente a respeito da
nossa dificuldade de expressão segundo seus respectivos pontos de vista], trouxe lá sua contribuição. Ele pareceu-nos querer atacar, principalmente, a 'generalização' [leia o artigo aqui].
Ok, de fato, a generalização apressada é algo reconhecidamente imprudente. Entretanto, é preciso tomar cuidado para não abrir a definição a ponto dela deixar de ser isso mesmo que pretendia ser: uma definição*¹.O tio Ari poderá nos ajudar (e falamos do bom Ari, ou seja, aquele macedônio, estagirita, da Grécia Antiga, filósofo reconhecido; e não um velho nada douto e sapiente que arroga autoridade de teólogo nos nossos dias ou de um tal boca suja que também intitula-se 'pastor'...)*².
Quando queremos definir algo temos que, primeiro, identificar um gênero (no sentido de 'classe', 'grupo maior') a qual determinado objeto de investigação se encaixa e depois distingui-lo das demais espécies. Façamos o exercício.
'Evangélico', para começo de conversa, é uma religião, e, como tal, acredita em alguma força maior e nalguma relação do home para com tal ser superior. Não é, pois, ateísmo, agnosticismo ou deísmo. Também não é uma ideia política, embora possa implicar em política; não é o nome de uma família ou de uma empresa, embora algumas igrejas têm famílias que parecem comandá-las como se lhes pertencessem, e outras parecem, de fato, empresas... Esse é o primeiro gênero que devemos salientar: é uma religião. Óbvio de ser dito, mas, a título de completude, necessário.
Em seguida, temos que nos lembrar de que há uma pretensão pelos ditos evangélicos de serem seguidores de Cristo, i. é., cristãos. Portanto, supõe-se algum vínculo com a figura histórica de Jesus. Portanto, não é de tradição oriental, embora algumas práticas cheirem a práticas orientais, como, por exemplo, a confissão positiva. Não é de linha muçulmana. Não é budismo. Não é de linha ocultista, mística, tal como as religiões de origem africana, embora algumas que se dizem 'evangélicas' tenham mais elementos dessas religiões do que elementos tradicionalmente cristãos. É, em maior ou menor medida, uma religião vinculada à pessoa de Jesus.
Mas não é qualquer Jesus. Os muçulmanos falam de Jesus como um profeta e nada mais do que isso. Há quem o veja como um grande mestre moral, e tão somente isso. Há ainda aqueles que o encararão como um espírito perfeito, que, meio que por emulação, nos levará à prática do bem. Concepções cada vez mais distantes. Remontando uma tradição 'moderna' (no sentido estrito do termo, i. é., algo pouco depois do Renascimento, ou ali 'encostada'), intitulada de Reforma Protestante - que por sua vez reivindica associação à um movimento mais antigo ainda, i. é., a fé da Igreja Primitiva - a qual reclamava fidelidade última às Escrituras Sagradas, 'evangélicos' seriam aqueles que pautam sua fé sobre Cristo tão somente naquilo que diz a Bíblia sobre ele. Esse é, ao menos em teoria, o discurso. Na prática, sabemos que não é bem assim e, bom, eis um critério para vermos se de fato estamos diante de um evangélico: é sua fé sobre Cristo tal como ensinada na Bíblia? Caso não seja, esse subgênero já teria de excluí-lo daqueles que reivindicam ser evangélicos.
Uma religião cristã fundamentada tão somente nas Escrituras. Se não quisermos nos delongar até às
controvérsias fundamentalistas do início do século XX, e entender quando é, exatamente, que o termo 'evangélico' surge, essa definição que inicia o parágrafo é mais do que suficiente para que façamos a peneira. Se perdermos esse parâmetro para dizer que 'evangélico É tudo', teremos a correta conclusão de que o termo é, o mesmo tempo, 'nada'. E, de fato, quando usamos de 'universais', estamos a alegar que tal expressão nos traga à mente algum conceito. Se o conceito diz respeito a tudo e a nada, não é um conceito, e a palavra torna-se menos significativa do que um arroto ou a emissão de uma flatulência, que ainda comunicam a existência de alguma vida (ou, a depender do odor, algo próximo à morte...) dentro do indivíduo.
É interessante, da parte do autor do artigo, demonstrar que o termo já não evoca mais nenhum conceito. Nesse sentido, ele está corretíssimo. Quando se perde o universal como um gênero que inclui todas as caraterística supracitadas, ele passa a não significar nada, e a incluir no seu conjunto cada vez mais elementos distintos, até que não se possa mais classificar qualquer coisa com aquele termo. É por isso, aliás, que muitos preferem se intitular de forma alternativa, como 'reformados', e.g., ao invés de 'evangélicos', para não serem confundidos com algo que está muito longe de ter algum parentesco com o que acreditam.
Mas não podemos, por conta da confusão gerada pelo termo, abrir mão de qualquer definição precisa que o termo costumava denotar. E nisso o autor peca. É um texto na 'Carta Capital', como já observamos, e, claro, era de se esperar que viesse eivado de vaidade politicamente correta. Sem uma definição, e salientando os vários tipos de pensamentos divergentes no seio da igreja cristã, deu a entender que se pode nomear cristão de forma legítima com as mais variadas crenças e práticas, pois haverá 'uma igreja para você'. Se há alguma intenção boa aí, há também um péssimo conselho. E, para isso, é interessante versarmos também sobre a questão das diferenças de pensamento.
Bons teólogos, sensatos, piedosos e notáveis acadêmicos distintamente cristãos protestantes notaram que há um 'mínimo divisor comum' entre os movimentos verdadeiramente cristãos. Embora haja uma disputa grande a respeito de quais são todos os elementos inegociáveis, há pontos pacíficos, tais como a criação da parte de Deus, i. é., que Deus é o criador do mundo e de tudo que nele há; a perfeição ontológica de Deus (como bom, santo, sábio, justo, todo poderoso, todo conhecedor, presente em todos os lugares e assim por diante). Trindade (incluindo a divindade de Cristo e pessoalidade do Espírito Santo); os méritos da nossa salvação como pertencentes a Cristo por pagar, na Cruz, a pena que cabia ao homem; a ressurreição literal de Cristo e sua segunda vinda visível. Isso é ser cristão bíblico. Há diferenças em várias questões periféricas, mas nenhuma dessas crenças podem ser omitidas ou serem contraditas por alguma outra crença nova. Feito isso, temos que considerar que tal 'particular' está fora do conjunto que poderíamos chamar de 'evangélicos', conforme definimos acima. Em poucas palavras, entre as igrejas e denominações que a partir da própria Bíblia poderíamos considerar cristãs há mais pontos de convergência do que pontos de divergência. E é nesse espírito que se unem para adorar a Deus juntos. Até aí temos 'ecumenismo'. Fora dessas paredes estaremos falando de sincretismo.
Se não fizermos essa distinção, corremos o risco de sermos precipitados, descuidados e tolos. Poderíamos tomar como 'evangélico' aquilo que não é, tal como chamar de pintura tudo e qualquer coisa que alguém fizer diante de uma tela. Se não estabelecermos parâmetros, perderemos as condições para dizer o que é uma produção artística, e o que é apenas uma bagunça diante de um tale em branco, embora para o leigo - há de se confessar - pareça tudo a mesma coisa.
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*¹ Para uma melhor compreensão do texto, sugerimos a leitura a partir do subtema 'Os Cânones da
Lógica', que se encontra no seguinte artigo: Introdução à Lógica Aristotélica
*² Para quem realmente não pegou a piada, estamos falando de Aristóteles.

quarta-feira, 3 de junho de 2015

Uma Breve Reflexão Sobre o Problema da Tolerância



Não, leitores, não somos contra a tolerância. Acreditamos ser um valor inestimável, inexorável. Temos, provavelmente, tanto apreço por ela como qualquer um dos inúmeros devotos ao termo que não tem, nem mesmo, uma compreensão adequada do que isso signifique, evocando, ao proferi-lo, no máximo, uma noção turva, genérica, sobre ele. E é justamente essa apreciação não plenamente consciente que causa todo o problema. Por isso, é preciso observar o que intolerância não é. Não pretendemos ser exaustivos mas apenas escancarar alguns dos erros mais cotidianos para nós, ou, visto de outro modo, confrontar o valor da tolerância com outros valores caros para várias vertentes de pensamento 'revolucionário' com as quais temos nos deparados.

Primeiro, esse é um valor ocidental. É produto de nossa cultura, exceto se adotarmos uma perspectiva tal como a de um hobbesiano ou rousseauniano, que poderia muito bem admitir a intolerância como um acordo de sobrevivência, o que o 'super-homem' de Nietzsche não veria razão para observar caso garantisse impunibilidade, ou um 'anel de Giges'*¹, tal como o descreve Platão. Anulada essa via, pensemos mesmo na ideia de que seja um produto de nossa cultura ocidental, grega, romana, judaico-cristã. Eis aí um problema para o tolerante que o associa ao relativismo cultural. Se não houver valor algum que seja comum para todos, então por que pensar que a tolerância deve ser? E, de fato, parece-nos que não seja algo que esteja no itinerário muçulmano... Será que temos que ser tolerantes com os intolerantes?
Mas o texto é curto, e não pretendemos nos demorar.

Há, em segundo lugar, um problema associado à determinada política 'vitimista', fundamentada numa antropologia para lá de problemática se levada realmente a sério. Basicamente, muito bandido é tratado como se fosse apenas uma vítima da sociedade, um produto do meio. O meio - o que inclui a cultura, o ambiente em que vive e todo o histórico do indivíduo - e/ou mesmo sua constituição biológica, argumentam à la B. F. Skinner, são os fatores determinantes para levá-lo - encarado quase como uma coação - ao ato criminoso*². Claro, esse pensamento pode ser reduzido ao absurdo, e tomando legitimamente suas premissas, não haverá como escapar de escusar todo e qualquer ato, julgando-o apenas como um produto natural, determinista, da combinação dos dois fatores que forma nosso comportamento. Agora, mesmo numa versão mais soft, que não quer admitir tais conclusões, ainda temos aquele considerado 'intolerante' nos nossos dias e na nossa cultura.
'A esse não podemos tolerar!', podem esbravejar. Mas que sentido há nisso? Aquele dito como 'intolerante' não pode ser, muito bem, alguém que foi criado dentro de um contexto no qual recebeu determinada educação e foi condicionado biologicamente para a prática da intolerância? Se ele está fazendo algo de errado, e principalmente se é considerado um estúpido por isso, não seria alguém digno de pena e reeducação, tal como os bandidos protegidos sob esse pretexto? E não adianta falar que o indivíduo intolerante tem escolha, pois logo advogaríamos o mesmo para o bandido*³.

Por fim, será que tolerar é não considerar o que o outro faz como sendo errado? Alguns podem até advogar que a questão é puramente estética, mas isso seria reduzir a moral à estética, o que a conduz para rincões emotivistas e aí não será, novamente, razoável falar em imoralidade da intolerância. Tolerar é justamente achar que o outro faz algo errado mas, de algum modo, descobrir uma maneira de conviver com isso e garantir que ele também viva com o juízo alheio sobre si, tal como acaba de avaliar seu juízo, i. é., ele julga que você está cometendo um erro, quiçá um crime, ao julgar-lo em erro. É uma faca de dois gumes. Só não pode-se negar que ela corta. Enquanto intolerância for encarada como o não direito à crítica estaremos o mais distante possível da tolerância.

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*¹ Platão, em sua 'A República', livro II, conta, nas falas de Gláucon, sobre um homem, Giges, que achou um anel que o tornava invisível e, assim, ele podia dar vasão a todos os seus desejos e fazer um monte de coisas sem ser visto por ninguém. A falta de punição revelou sua vilania e a do gênero humano.
*² Estamos pensando, particularmente, no 'fisicalismo' no que diz respeito à filosofia da mente. Em breve estaremos publicando um artigo sobre o assunto para mostrar sua irracionalidade.
*³ Seria interessante considerar outro artigo que elaboramos no qual explorarmos um pouco melhor as incongruências dessa política. Para isso, clique aqui.

terça-feira, 21 de abril de 2015

Conheçam os Bons Pensadores Cristãos Brasileiros

Conversando com alguns amigos e percebendo, em nossa experiência cristã, o quão deplorável são as influências dos tidos por ícones do pensamento cristão hodierno, resolvemos, para além das iniciativas pessoais, escrever um artigo de recomendações. Ele se destina a você que imagina que 'pastor Lucinho', Silas Malafaia, Ariovaldo Ramos, Caio Fábio, Ed Rene Kivitz e tutti quanti* são os 'teólogos' e pastores que dispomos para nos informar, que são os baluartes da fé cristão no Brasil. Temos a maravilhosa notícia de informá-lo sobre seu equívoco. Esses caras não são nem boas influências, e nem de longe os mais cultos e piedosos pensadores que temos. Infelizmente, estão em voga. E, com isso, furtam a cena daqueles que verdadeiramente deveriam ser vistos e ouvidos. Além de, não raro, falarem besteira, nos envergonham perante a sociedade e camuflam o evangelho com suas mensagens genéricas e, amiúde, heréticas. Essa gentalha faria um grande favor ao reino de Deus se ficassem calados. Basta comparar o currículo e a competência de cada um com os que indicaremos. Se você é um dos que aprecia algum desses, queira, pelo bem de sua alma, desapegar-se (ou pelo menos tentar). Dê uma chance a esses nobres senhores que vos apresentamos*. Ore muito e veja se não estamos certos!

Bom, como recomendar genericamente não faz com que ninguém procure, de verdade, pelas indicações, daremos indicações específicas, com um link. Mas queremos que extrapolem essas indicações. Vejam mais coisas. Procurem mais pregações, sermões, palestras e aulas no youtube ou google-vídeos. Aliás, nem precisam ver exatamente essas pregações que sugerimos. Procurem pelos temas que lhes interessar nas buscas pelos nomes destes.


Augustus Nicodemus Lopez
O Batismo com o Espírito Santo

Daniel Santos
Exposições em Jó

Franklin Ferreira
O Credo dos Apóstolos

Guilherme de Carvalho
O 'Salto' na Cultura Contemporânea

Heber Carlos de Campos
Romanos 1:8-15

Heber Jr.
Amando a Deus com Todo o Nosso Entendimento

Hermisten Maia Pereira Costa
Teologia, Igreja e Academia

Jonas Madureira
Idolatria

Josemar Bessa
Inferno (Naum e Rob Bell)

Leandro Lima
As Característica de Uma Fé que não Salva

Ludgero Bonilha
Salmo 1

Luiz Sayão
A Religião que Mata a Fé e o Coração

Marcos Granconato
A Negação de Pedro

Mauro Meister
A Origem da Idolatria

Paulo Anglada
Outro Evangelho

Paulo Romeiro
Pentecostalismo [e hermenêutica]

Samuel Vieira
Três Impulsos que Podem nos Destruir

Solano Portela
O Evangelho que Envergonha





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*Não mencionamos os clássicos Edir Macedo, R. R. Soares e os demais super-poderosos porque acreditamos que quase ninguém os considera teólogos. Até mesmo aqueles que apreciam os mencionados desprezam esses aqui, no rodapé, mencionados. Mas, para não restar dúvidas, afirmamos que eles estão inclusos entre aqueles que não devem ser ouvidos.
*É bom notificar-lhes que não é uma lista exaustiva, e podemos até mesmo aumentá-la. Alguns bons pensadores não têm palestras ou pregações em vídeo. Mas só nesses nomes já teremos material para anos de 'entretenimento'.

segunda-feira, 6 de abril de 2015

Diálogos sobre a Homossexualidade


Era um jantar em família. Uma família tradicionalmente cristã - embora fosse só uma confissão nominal -, reúne-se em um restaurante para comemorar a Páscoa. Mais cedo já haviam trocados ovos de chocolate e todos estavam contentes. Dentre as várias pessoas que ali se encontravam, três nobres senhores [e o adjetivo certamente será subtraído a um deles, no decorrer do texto... fica aqui apenas como efeito retórico], com cosmovisões muito distintas, merecem nossa atenção. São parentes. Um é um homossexual, e o chamaremos de Sr. Rosa. Outro é um homofóbico que será denominado de Sr. Vermelho [até porque comunistas não se davam muito bem com homossexuais... mas pensamos na cor mais para simbolizar violência, sangue]. O terceiro e último homem é o Sr. Cristão, e trata-se de um bom cristão reformado (que acredita que os proponentes da Reforma Protestante estavam certos e que realmente remontaram a fé original, bíblica). Também, não haveria como não notá-los. Por 'força do destino', o assunto acabou rumando-se para aquelas questões polêmicas típicas que tumultuam um encontro desses e geralmente não são nada produtivas. O assunto era homossexualidade. O Sr. Rosa, suspeita do Sr. Vermelho e aproveita para, elegantemente, evocar a discussão diante dos presentes, o que lhe conferiria certa segurança e poderia angariar repúdio ao pensamento daquele que tanto lhe quer mal. Em certo sentido, era uma medida preventiva. E lhe doía o desprezo de seu parente, principalmente o que ele insistia em propagar aos demais familiares noutras ocasiões que não estava presente. Além disso, o parente que tinha menos contato, o sr. Cristão, possivelmente devia fazer o mesmo, embora os exemplos de Cristo pudessem torná-lo mais ameno. Seja como for, se ele coadunasse com o Sr. Vermelho, já seriam dois coelhos com uma cajadada só.

Sr. Rosa - Vocês explicam como, para vossos filhos, a respeito da relação entre coelho, ovo e chocolate?
Sr. Vermelho - Não precisamos explicar. Têm apenas que aceitar.
Sr. Rosa - Mas, então acham possível que convivam com essa besteira e não conseguem explicar que duas pessoas do mesmo sexo se amem?
Sr. Cristão - Não acredito que devemos chamar nem a um nem a outro de normal. Nada me obriga. Posso explicar para meus filhos que as coisas não são bem assim.
Sr. Vermelho - Além disso, uma coisa é um mito, uma lenda. É algo imaginativamente possível. Não tem que ver com conduta moral...
Sr. Rosa - O que dizem a vossos filhos sobre mim? - perguntou meio que para quem quisesse responder.
Sr. Vermelho - Que você faz algo muito errado! - respondeu, de prontidão, ainda que tentando se conter.
Sr. Rosa - Só isso? E eles acham que sou uma espécie de criminoso? - insistiu ao suspeitar que o Sr. Vermelho tivesse mais para falar.
Sr. Vermelho - Talvez, mas eu vos ensinei que não adiantaria prendê-los, pois poderiam apreciar o cárcere... - falou diminuindo um pouco o tom por perceber ter dito algo muito ofensivo, mas achava-se no dever de falar o que cria.
Sr. Rosa - E você, sr. Cristão, o que me diz. - disse, contendo-se, por ser educado, após ouvir o que achou uma barbaridade da parte do Sr. Vermelho.
Sr. Cristão - Em partes, penso como o sr. Vermelho. Acho que fazes algo muito errado. Entretanto...
Sr. Rosa - Poderia dizer-me, pois, qual a diferença entre vocês dois? - interrompeu-o abruptamente, já um tanto quanto alterado emocionalmente diante de uma confissão assim, começando a sentir-se, inda que não numa dimensão perfeitamente consciente, malquisto por toda a família. - Afinal, não foi Jesus quem ensinou-vos amar ao próximo? Quando Jesus disse que devemos fazer aos outros o que queremos que nos façam, não inclui igualdade? Responda-me, sr. Cristão, pois sei que és interessado em teologia e vives a conversar sobre essas coisas. Não conheces esses textos?
Sr. Cristão - Bom, sr. Rosa, eu entendo seu estado emocional diante do que ouvistes. Mas quero assegurar-te, antes de mais nada, que não concordo que sejas um criminoso e que mereces algo pior do que o encarceramento...
Sr. Vermelho - Eu não disse 'algo pior'!
Sr. Cristão - Tudo bem, sr. Vermelho. Seja como for, no mínimo pareces dizer que os homossexuais merecem uma punição semelhante ao dos criminosos. Quero que saibam que eu não penso assim e estou persuadido de que não é a posição bíblica a esse respeito.
Sr. Vermelho - Veja que não sou cristão, mas sei que a Bíblia mandava apedrejar (ou algo assim) aos que faziam essas abominações.
Sr. Rosa - Perfeitamente, sr. Cristão. Como respondes a isso? A Bíblia, também, no mesmo momento que condena a homossexualidade - o que há bons intérpretes que discordam, mas não vem ao caso -, recomenda compra de escravos e até o formato da barba e corte de cabelo! Parece que o sr. não é tão coerente assim com esses deveres. Como excluis uns e não outros? E não venhas me dizer que aqueles que rejeita caducaram ao passo que os preceitos que aceita permanecem. Parece-me arbitrário arguir assim.
Sr. Cristão - Bom, temos que nos acalmar aqui. Estamos abrindo muitas pontas soltas e creio que não estão dispostos a me ouvir discursar demoradamente sobre esses temas.
Sr. Vermelho - Se te demoras é porque está nos enrolando.
Sr. Rosa - Não pode nos responder de forma resumida?
Sr. Cristão - Há questões complicadas que demandam explicações mais elaboradas. É a natureza do problema que determina sua complexidade.
Sr. Rosa - Pois tente um resumo, por favor! Quero muito entender-te. Prometo esforçar-me pare entendê-lo. Posso até pesquisar mais sobre. Sei como é não ser compreendido e ter muito a falar...
Sr. Vermelho - ...
Sr. Cristão - Bom. Deixa-me resumir da seguinte maneira. Existem critérios lógicos que os teólogos, no decorrer dos anos, elaboraram para explicar o fenômeno neotestamentário de abraçar algumas leis e rejeitar a outras. Afinal, os apóstolos e a igreja primitiva não andavam em conformidade com todas as prescrições do Pentateuco, i. é., dos livros de Moisés.
Existe uma noção muito popular que divide a 'Lei' (como é, também, chamado o Pentateuco - mas há momentos em que usamos o termo para o decálogo e outras para a lei moral) entre leis cerimoniais, leis civis e leis morais. As cerimônias e as leis civis tinham valores transitórios, para um momento específico da história da humanidade, especialmente voltadas para os judeus. As leis cerimoniais eram leis litúrgicas e não obrigavam a mais ninguém além dos judeus. E num regime teocrático, ou mesmo na monarquia hebreia, haveria uma rigidez muito grande para com as coisas santas...
Sr. Rosa - E nessas 'coisas santas' incluía a morte dos homossexuais?
Sr. Cristão - Sim, certamente. Mas, espere, não me interrompa ou então não compreenderás a questão. Da mesma forma que o homossexualismo era punido com morte, também o era o adultério, o estupro e até mesmo a rebeldia indomável de um jovem que se levanta contra seus pais. Era inadmissível que os valores celestiais não fossem estritamente observados num povo que portaria a descendência do Messias! Bom, essa é uma divisão útil, mas prefiro, ainda, uma outra divisão...
Sr. Rosa - Mas, sr. Cristão, as pessoas nascem homossexuais! Não é uma escolha!
Sr. Cristão - Sr. Rosa, insistes em me interromper. Assim não poderás compreender muito bem meus posicionamentos.
Sr. Rosa - É que não pensei que falavas tão a sério quando dizias que demorarias...
Todos dão algumas gargalhadas, quebrando um pouco da tensão. Algumas mordiscadas na comida que já esfriava e tornaram ao diálogo.
Sr. Rosa - Bom, sr. Cristão, acredito que já entendi o seu ponto. As normas se restringiam a uma determinada situação política ou para um determinado problema específico, como não comer carne de porco por não terem condições assépticas para evitar doenças na época...
Sr. Cristão - Algo nesse sentido.
Sr. Rosa - Mas, e quanto à escravidão?!
Sr. Cristão - É outro assunto que demanda uma dosagem de paciência... Bom, basicamente, os judeus humanizaram a prática social tão comum da antiguidade. Escravos sexuais seriam abomináveis. Os escravos deveriam ser tratados como pessoas, seres humanos que, por eventualidades, acabaram por chegar àquela situação social. Não poderiam trabalhar mais do que um trabalhador qualquer e deveriam ser tratados com amor. Muitos se apegavam à família a quem serviam. Haviam possibilidades múltiplas de alforriar-se mas mesmo assim alguns insistiam em continuar com seus amos. Não te estranhas que os profetas que fizeram tantos discursos sobre desigualdades e injustiças sociais não tenham se compadecido deles? O assunto não lhes era estranho. Eles foram escravos dos egípcios e foram tratados de forma muito ruim. No entanto, o escravo dos hebreus seria, inclusive, circuncidado e levado a cultuar a Deus junto a eles! Isso, para os judeus, era o reconhecimento maior de sua dignidade.
Sr. Vermelho - Não estou tão certo assim de que essa argumentação convence e entendo que naqueles tempos era comum tomar os povos vizinhos, conquistados nas guerras, como escravos...
Sr. Rosa - E achas que isso é certo agora?
Sr. Vermelho - É certo que não!
Sr. Rosa - Então admites que pode haver progresso social?
Sr. Vermelho - Sim. Mas não significa que toda novidade deva ser tomada como progresso.
Sr. Cristão - Perfeitamente, sr. Vermelho. Finalmente deras uma dentro nesta noite!
Sr. Rosa - Mas estou a rejeitar a modernidade, senhores! Por um acaso acreditam que devamos voltar a ter escravos? Devemos suprimir o sufrágio feminino?
Sr. Cristão - De modo algum! Mas você deve entender que apreciarmos uma cultura não implica em abraçarmo-la toda. E ao criticar uma parte não temos que rejeitá-la, igualmente, de forma integral.
Sr. Rosa - Mas não consideras a igualdade entre os homens como um progresso modernos?
Sr. Cristão - Isso depende muito do que queres dizer com igualdade.
Sr. Rosa - A aceitação do homossexualismo é uma expressão de igualdade. Se antes os homens eram bárbaros e agora podem pensar melhor sobre essa questão, então certamente estamos em condições mais adequadas. Ou não acreditas que o fim da discriminação - ao menos oficial - não constituiu progresso.
Sr. Cristão - Acredito! Mas não acredito que a causa gay o seja.
Sr. Rosa - Mas você tem que ver que é apenas um desdobramento natural da cultura que, em grande parte, foram vocês mesmos que construíram. Como, agora, decidem abandonar suas crias?
Sr. Cristão - Estais muito equivocado, sr. Rosa. Lembra-te que o homossexualismo era uma prática comum na sociedade romana, entre os espartanos e noutros momentos e situações históricas antigas. Há quem diga, inclusive, que os professores gregos, na antiguidade, praticavam sexo com seus alunos que não são, exatamente, o que chamaríamos hoje de maiores de idade. Nesse sentido, poderíamos dizer que estamos regredindo e não progredindo. Aliás, para que a prática fosse condenada no livro de levítico temos de concordar que fosse antiga. E por haver uma pontual crítica, na Torá (outro nome para o Pentateuco) aos costumes pagãos antigos, é de se presumir que esse era um costume de povos antigos pagãos.
Sr. Vermelho - Além disso, o homossexualismo é anti-natural! Até a Bíblia fala isso - e corrija-me se eu estiver equivocado, sr. Cristão!
Sr. Cristão - Está correto. Paulo, por exemplo, o diz em sua epístola aos Romanos.
Sr. Rosa - Pois eu já digo que é natural. Aliás, sr. Cristão, você não me respondeu o que fazer com essa questão pois, afinal, é congênito. Como poderíamos, pois, deixar de pecar?
Sr. Vermelho - Natural? Não mesmo!
Sr. Rosa - Isso não constitui uma refutação, sr. Vermelho. Só um esbravejamento, e ética não se elucubra com meras expressões subjetivas. Até, aliás, reformulo o que disse. Eu diria que o termo 'natural' é um tanto quanto polissêmico. O que querem dizer com isso?
Sr. Vermelho - Permita-me, primeiro, sr. Cristão?
Sr. Cristão - Sim, à vontade! Aproveito e como um pouco enquanto vos ouço.
Sr. Vermelho - Muito bem, sr. Rosa. Acredito que não podes negar que há males para a própria preservação da espécie se aceitarmos, como legítimo, o casamento gay, não é mesmo?
Sr. Rosa - Discordo. Se legitimarmos o casamento gay e coisas do tipo não estaremos, com isso, obrigando ou forçando as pessoas a se tornarem homossexual. Acredito, certamente, que muitos sentir-se-ão menos agrilhados e o que chamam por aí de 'sair do armário' tenderá a crescer.
Sr. Vermelho - Então concordas que a liberação acabará por influenciar a sociedade?
Sr. Rosa - Não determinantemente, e nem predominantemente. A maioria das pessoas continuam sendo heterossexuais nos lugares mais permissivos - se é que são mesmo, pois acredito que todos tenham alguma tendência...
Nesse momento o sr. Vermelho fez um movimento brusco e o sr. Rosa viu que exagerou.
Sr. Cristão - Sr. Rosa, se algum cristão o interpelasse dizendo que, no fundo, o senhor sente atração por mulheres, o senhor sentir-se-ia satisfeito?
Sr. Rosa - É evidente que não! Já entendi seu ponto. Perdoem-me. Mas pareces admitir que é congênito...
Sr. Cristão - Protelemos este ponto. Continuem de onde pararam.
Sr. Vermelho - Muito bem. É inegável que a aceitação da sociedade fará com que várias pessoas assumam-se gays. Muito mais do que agora. E muitos o farão, até mesmo, por moda. Isso minorará nossa capacidade procriativa.
Sr. Rosa - Bom, primeiro que, por esse raciocínio, terias de condenar tudo o mais que não procria.
Sr. Vermelho - Como assim?
Sr. Rosa - O celibato também teria de ser condenado, posto que atenta contra a preservação da espécie.
Sr. Vermelho - Talvez. Por que não? Fazes um ad baculum!
Sr. Rosa - Ok. E achas que o baculum não lhe atinge? Pois mostrarei que atinge...
Sr. Cristão - Permitam-me interrompê-los por um breve instante. Preciso salientar que não considero, como parece considerar o sr. Vermelho, a preservação da espécie como o valor supremo pelo qual se julga todas as demais coisas. E é evidente que não recrimino o celibato. Não em si, conforme as Escrituras... Mas, prossigam.
Sr. Rosa - Bom, sr. Vermelho, o senhor compactua com a ideia de que o os homossexuais agem contra a natureza por praticarem sexo que não é para a procriação?
Sr. Vermelho - Até porque não podem, não é mesmo...
Sr. Rosa - Indubitavelmente que não. Mas não vem ao caso. Sei que não és católico também. Por isso, não tomas o sexo como se tivesse esse único fim.
Sr. Cristão - E diante de um católico, o que dirias?
Sr. Rosa - Diria que, se assim fosse, eles teriam de parar com uma série de outras práticas que parecem dar uma utilidade secundária para os vários órgãos que têm. Eles usam a boca para beijar, e ela parece ter sido feita para comer e falar. Usam as mãos para tocar violão, além de servirem para a obtenção de alimento. Além disso, teriam de proibir a masturbação e o sexo oral também.
Sr. Cristão - Argumentação interessante. Mas eles proíbem masturbação. Retires essa parte do argumento...
Sr. Rosa - Hum. Percebo. Enfim, o argumento se segue. Além disso, se corrermos para a ideia de que os órgãos estariam sendo usados para fins inapropriados, ou não naturais, estaríamos incorrendo em grandes dificuldades. Seria como se alguém tivesse pensado neles...
Sr. Vermelho - Já entendi o seu ponto.
Sr. Cristão - Noto que essa argumentação teria poder de convencimento somente sobre aquele que concorda com os teus pressupostos naturalistas. Se Deus existe e criou o homem, é perfeitamente razoável pensar que os órgãos foram criados para fins determinados e que usá-los para outros fins seria errado.
Sr. Rosa - Os olhos foram feitos para ver. Mas isso te impede de dar uma boa piscadela?
Sr. Cristão - Não. Mas as mãos foram feitas para vários fins, conforme a criatividade humana, que é dom de Deus. No entanto, elas podem ser usadas de forma inadequada para matar. E de fato foram.
Sr. Rosa - Mas não são vocês que defendem que existe guerra santa e coisas do tipo? Nesse caso, há um uso legítimo das mãos para causar dano.
Sr. Cristão - Como tu abres pontas, sr. Rosa! É bem possível que eu tenha deixado algum ponto sem responder por não conseguir me lembrar de todos, e não por não ter respostas. Pois bem, percebestes o meu ponto. Há momentos adequados e pessoas certas para usarmos nossos membros, órgãos e afins. E o sexo é destinado aos casais.
Sr. Vermelho - É fácil mostrar que é contra a natureza! Basta olharmos para a maioria esmagadora das pessoas sobre a terra. Logo será notado que é algo anormal.
Sr. Rosa - Irritar-te-ás, mas tenho que refutá-lo novamente. Se as coisas são decididas, assim, por estatística, então ser albino, que é 'anormal', é, também, errado.
Sr. Vermelho - Mas ser albino não é opção ou ação moral!
Sr. Rosa - E quem falou que ser gay o é?!
Sr. Cristão - Parece inevitável que entremos nessa questão, não é mesmo? Bom, para começo de conversa, sr. Rosa, crês que as condições biológica são indelevelmente determinantes?
Sr. Rosa - Bom, às vezes sim, às vezes não. Também acredito e admito no poder educativo. Mas acredito que a força mais determinante é a biológica.
Sr. Vermelho - Então acreditas que um psicopata também não tem escolha?
Sr. Rosa - Não é isso!
Sr. Cristão - Parece-me um corolário do que afirmas e pressupões, senhor Rosa. Aliás, parece-me enredá-lo também, sr. Vermelho.
Sr. Vermelho - E como tu vês isso?
Sr. Cristão - Acredito que existam fatores espirituais determinando as escolhas. Mas há cristãos que acreditam que as escolhas não são eficientemente determinadas, e outros que as vêem fortemente influenciadas. Não vem ao caso entrarmos nessa discussão prolongada da teologia agora, acredito eu.
Sr. Vermelho e Sr. Rosa - Não mesmo!
Sr. Rosa - Muito bem, sr. Cristão, ainda quero tua apreciação. Como é que eu, que sinto atração natural por homens, poderia deixar de pecar?
Sr. Cristão - Na verdade é muito simples, mas como tudo que envolve conselhos sexuais, dado seu poder de nos mover, é difícil de aceitar. O que tens que entender é o seguinte. A Bíblia não condena as tendências homossexuais. A Bíblia condena as práticas homossexuais, e essa distinção é crucial!
Sr. Rosa - Mas seria legar-nos uma vida muito infeliz, sem poder amar!
Sr. Cristão - Na verdade, concebes a felicidade e a santificação de forma pobre, caro sr. Rosa. Para começo de conversa, a santificação demandada pelas Escrituras implica em abdicação da parte de todos. Alguns em maior grau, outros em menor. De alguns exige a castidade. Acredito que o mesmo se dê com os que têm tendências homossexuais. Por exemplo, condenamos a promiscuidade, a fornicação o adultério e demais pecados sexuais, e a prática homossexual está inclusa. Aliás, é possível até mesmo que alguém que não tenha tendências homossexuais resolva 'experimentar', o que seria condenável da mesma forma. Pessoas menos dotadas de beleza ou com alguma deficiência podem querer se rebelar e voltar-se a qualquer tipo de relacionamento que o Senhor desaprove. Entretanto, aquele é o fardo que fora destinado a elas. Podemos e devemos tentar ajudar de todas as formas possíveis, mas não podemos ceder que elas pequem para tentar aliviar suas dores.
Sr. Rosa - Algo ficou pendente! Como sei que essa norma que proíbe o homossexualismo não é mais uma daquelas obsoletas?
Sr. Cristão - Bom, praticamente porque a razão de ser dela não cessou. Não tornou-se natural...
Sr. Rosa - Novamente a questão do 'natural'...
Sr. Cristão - Mas veja que justifico minha teleologia. Além do mais, o fato de um homem e uma mulher conseguirem procriar parece-me, sim, um indício de que são o par natural.
Sr. Rosa - Falas como se fosse uma doença!
Sr. Cristão - Bom, certamente é um 'defeito', fruto do pecado no mundo, e que manifesta-se particularmente causando esse desregulamento.
Sr. Rosa - Se concebes que alguém com tendências naturais para crimes deves conter-se e agora parece falar da mesma forma a respeito do homossexualismo...
Sr. Cristão - Tens, tal como aqueles, que conter teus impulsos. Por mais desagradável que seja, é assim que tem que ser. E é assim para ti e para ele. Tens que admitir que dentro de um quadro teórico que toma os pressupostos bíblicos, as coisas são assim.
Sr. Rosa - Pois prossiga na explicação da Bíblia Sagrada.
Sr. Cristão - Bom, como era uma norma moral, que não cessou as razões para existir, e que é reiterada no Novo Testamento, então é fato de que é bíblico continuar a afirmar que é pecado a prática homossexual.
Sr. Rosa - Mas, então Deus quer que sejamos infelizes?
Sr. Cristão - Não, sr. Rosa. Certamente é possível que ele queira que tenhas vida casta. Mas estaria, apenas, privado de uma alegria, e não de todas, muito menos da principal, que é saciar a sede de tua alma com a água da vida. Além disso, há esperança. Eu mesmo conheço pessoas com tendências fortes ao homossexualismo que acabaram conseguindo superá-las e até namoram! Algumas relatam que perderam toda a atração para com o mesmo sexo! Mas só Deus sabe qual será teu destino. Uma coisa é certa, ele quer que te retraias.
Sr. Rosa - Percebo... mas não acredito no teu Deus!
Sr. Vermelho - Não precisa, retomemos a questão da preservação da espécie...
Sr. Rosa - Essa é fácil de responder, sr. Vermelho. Basta que os gays se reproduzam com barrigas de aluguel, inseminação in vitro e coisas do tipo... Entre os teus argumentos e os do sr. Cristão, é muito mais razoável acompanhá-lo.
Sr. Cristão - De fato, por um viés utilitarista, acho difícil condenar a prática homossexual. Ela parece-me tão ameaçadora quanto aquelas mentirinhas insignificante que as pessoas contam. Mentiras que não prejudicam a ninguém. Aparentemente, se são insignificantes nos resultados que produzem, são também para a moral em si. O problema é que, se existe um Deus, os valores existem objetivamente, e mesmo que as transgressões não produzam algum efeito ruim, elas são más em si. A propósito, uma cosmovisão cristã consistente, inclusive, admitiria que as coisas podem até estarem desequilibradas nesse mundo. Injustiças não são sempre castigadas, por exemplo. Mas isso se dá porque ainda estamos numa realidade de 'Queda'. O mundo não é o que deveria ser por causa de sua contaminação pelo pecado. Talvez seja por isso que as coisas não venham a dar tão errado para várias injustiças.
Sr. Vermelho - E o que respondes às questões a respeito de serem felizes, sr. Cristão? Sei que condenarias minha juventude também, mas estava apenas sendo feliz...
Sr. Cristão - Estaríamos entrando, talvez, para um outro assunto...
Sr. Rosa - Não, de forma alguma. É, ainda, sobre sexualidade.
Sr. Cristão - Bom, o problema é que estão tomando felicidade por hedonismo grosseiro. Nem é preciso ser cristão para saber que isso não traz, necessariamente, felicidade...
Sr. Rosa - Eu não estava encarando as coisas assim. Falava de amar de verdade...
Sr. Cristão - Bom, faríamos um looping eterno aqui, pois eu insistiria que a maior felicidade está em encontrar-se com Cristo e as outras coisas são, embora importantes, adendos.
Sr. Rosa - Ainda acho que furtam nossos direitos ao mesmo tempo que pregam igualdade. Parece, pois, que a Bíblia é incoerente.
Sr. Cristão - Bom, seria interessante salientarmos que os direitos de igualdade conquistados por mulheres e negros devem muito às investidas de cristãos... Mas, detenham-nos no que dissestes. Igualdade é o direito de toda pessoa poder se casar. Mas casamento, essencialmente, é, segundo as Escrituras, algo realizado entre um homem e uma mulher.
Sr. Rosa - Mas isso não limita o conceito de igualdade?
Sr. Cristão - E dirias que o conceito de liberdade é limitado quando eu digo que não podes intentar contra minha vida?
Sr. Rosa - Não mesmo!
Sr. Cristão - Pois bem, acredito que o fazes porque acredita que a liberdade é condicionada e cerceada por princípios. A igualdade também. Todo homem tem o direito a relacionar-se com uma mulher. Toda mulher tem o direito de relacionar-se com um homem. Quando se diz 'ter direitos iguais', queremos dizer que algumas coisas lhe são inerentemente pertencentes. A questão é discutir o que são essas coisas.
Sr. Rosa - Pois digo que é amar e ser amado por quem bem se entende.
Sr. Cristão - Inclui, pois pedofilia?
Sr. Rosa - Claro que não! A criança não pode consentir de forma não viciosa!
Sr. Cristão - Inclui, zoofilia?
Sr. Rosa - Também não!
Sr. Cristão - Com todo o respeito, mas não vejo com quais critérios elimina esses itens. E vou mais além, digo que dizes o que é certo e errado recorrendo a algum padrão absoluto de moralidade.
Sr. Rosa - Aonde queres chegar com isso?
Sr. Cristão - Que se o padrão disser que é errado fazer algo, não importa se as pessoas consentem ou se acreditam ter esses direitos.
Sr. Rosa - Tudo bem, mas e se eu não aceito esse padrão?
Sr. Cristão - Terás de justificar o padrão pelo qual decides...
Sr. Rosa - Combinado, mas deixemos essa discussão para outro momento. Por hora, eu diria que rejeito o teu Deus.
Sr. Cristão - Sim, todos já estão fartos. Eu concluiria que é o único jeito de continuares sustentando teu homossexualismo.
Sr. Vermelho - Bom, boa noite a todos. De ti, sr. Rosa, não quero nem amizade.
Sr. Cristão - Pois faço questão de devotar-lhe carinho e respeito, desde que mantenha o decoro e o pudor na frente de meus filhos e dos filhos dos outros, como demonstrastes hoje pela noite. No mais, serás tratado por mim com a misericórdia que trato meus amigos que vivem vidas desregradas. Entendo que continuas em rebeldia contra Deus e quero demovê-lo desse caminho.
Sr. Rosa - Pois aprecio muito sua postura, sr. Cristão. Espero que estreitemos os laços e tu possas me apresentar esses seus amigos que mudaram de vida para que eu veja com meus próprios olhos e ouça deles mesmos o que lhes aconteceu.
Sr. Cristão - Será um prazer!