Não sabemos, com exatidão, se
Aristóteles e Platão se desentenderam já na Academia. Mas é indubitável que
Aristóteles tenha se levantado, posteriormente, após a morte de Platão, como o
inimigo ferrenho do sábio de Atenas. A todo momento, como veremos, o Estagirita
estará a desafiar o sábio aristocrata. Os escritores de história da filosofia
reconhecem tal conflito. Talvez seja uma boa via começar a exposição do
pensamento de Aristóteles expondo justamente a discórdia entre os dois
brilhantes vultos da Antiguidade.
O PROJETO
FILOSÓFICO DE ARISTÓTELES: A SUBVERSÃO DA METAFÍSICA E EPISTEMOLOGIA PLATÔNICA
Havia um ponto de
concordância entre os dois filósofos. Concordavam que os exemplares, os
individuais ou particulares das ideias, eram contingentes, i. é., estavam em
constante mudança, ou, em termos heraclitianos, fluíam. Concordavam que as
‘formas’, i. é., as ideais essenciais dos particulares eram permanentes, fixas,
ou seja, não fluíam. Mas discordavam num ponto fundamental: as propriedades
ontológicas dessas formas. Para Platão eram entes reais, inclusive, ‘mais
reais’ do que os próprios particulares. Já Aristóteles via-as como meras
abstrações. Não se tratavam de substantivos concretos, mas abstratos. Em outras
palavras, elas existiriam somente na mente dos homens. Não haveria, pois, uma
realidade, um plano metafísico onde elas ‘residiam’. Estamos, basicamente,
expondo as ideias de Gaarder: “Assim como os filósofos que o antecederam,
Platão também queria encontrar algo de eterno e de imutável em meio a todas as
mudanças. Foi assim que ele chegou às ideias perfeitas [...] Platão considerava
essas ideias mais reais do que os próprios fenômenos da natureza. [...]
Aristóteles achava que Platão tinha virado tudo de cabeça para baixo. Ele
concordava com seu mestre em que o exemplar isolado do cavalo ‘flui’, passa, e
que nenhum cavalo vive para sempre. Ele também concordava que, em si, a forma
do cavalo era eterna e imutável. Mas a ‘ideia’ cavalo não passava para ele de
um conceito criado pelos homens e para os homens, depois de eles terem visto um
certo número de cavalos. A ‘ideia’ ou a ‘forma’ cavalo não existia, portanto,
antes da experiência vivida” (GAARDER, p. 122-123).
O que estava em disputa, como
nota Durant, era a questão da propriedade ontológica dos universais:
"Deixando essa retaguarda da lógica, entramos no grande campo de batalho
no qual Aristóteles decidiu com Platão a terrível questão dos universais [...].
Um universal, para Aristóteles, é qualquer substantivo comum, qualquer nome
capaz de uma aplicação universal aos membros de uma classe. Assim: animal,
homem, livro, árvores são universais. Mas esses universais são ideias
subjetivas, não tangíveis realidades objetivas [...] tudo o que existe fora de
nós é um mundo de objetos individuais e específicos, não de coisas genéticas e
universais [...] é uma abstração mental prática, não uma presenta externa ou
realidade' (DURANT, p. 64).
Ao passo que podemos
considerar Platão um seguidor de Parmênides, portanto, um racionalista
convicto, podemos considerar Aristóteles um ‘discípulo’ de Heráclito que, por
sua vez, como dita a cartilha oficial, é considerado um empirista. Portanto, a
subversão de Aristóteles alcança não somente um viés metafísico mas, também,
epistemológico, como nota Chalita, recordando um pouco o que já dissemos e
levantando pontos que exploraremos no devido momento: “Para Aristóteles, seria
possível conhecer o mundo por meio da experiência sensorial, aplicando a razão
nos dados fornecidos pelos cinco sentidos, descobrindo assim a essência das
coisas [...]. O conhecimento é a abstração da natureza dos objetos e dos seres.
[...] Não há um mundo onde as ideias existam por si mesmas; as ideias são o
resultado de um processo conduzido pelo intelecto” (CHALITA, p. 61).
Para quem acha exagerado demais
o termo ‘subversão’, Gaarder deixa claro o teor radical da mudança,
ressaltando, novamente, nossa exposição: “uma dramática mudança de pensamento.
Para Platão, o grau máximo de realidade está em pensarmos com a razão. Para
Aristóteles, ao contrário, era evidente que o grau máximo de realidade está em
percebermos ou sentirmos com os sentidos. Platão considera tudo o que vemos ao
nosso redor na natureza meros reflexos de algo que existe no mundo das ideias
e, por conseguinte, também na alma humana. Aristóteles achava exatamente o
contrário: o que existe na alma humana nada mais é do que reflexos dos objetos
da natureza” (GAARDER, p. 123).
Ronald Nash coloca a coisa em
termos um pouco diferentes. Ele nos lembra que muitas das objeções de
Aristóteles já estavam presentes na obra ‘Parmênides’ de Platão. Aristóteles
estava convencido de que podia corrigir e superar seu mestre: “Como o próprio
Platão reconheceu em sua obra Parmênides os mais sérios problemas de sua teoria
resultam da extrema separação entre esses dois mundos. Aristóteles repetiu
muitos dos argumentos encontrados em Parmênides contra a existência separada
das formas. A esses, ele acrescentou a nova acusação de que o mundo das formas
é uma duplicação inútil do mundo físico. Aristóteles cria que pudesse evitar a
introdução dessa duplicação desnecessária do mundo que existe e ainda explicar
todas as coisas que Platão tentou explicar com suas formas separadas. O ponto
central da discordância de Aristóteles com a teoria das formas foi a
insistência de Platão em sua existência separada. Aristóteles continuou a crer
que as formas ou universais realmente existem, e cria que as formas são os
únicos objetos próprios do conhecimento humano. O que Aristóteles fez [...] foi
trazer para o mundo físico as formas de Platão” (NASH, p. 105)*1.
É compreensível a propensão
natural a aceitar Aristóteles. Toda aquela ideia de Platão parece muito
fantasiosa. Aristóteles traz, semelhante aos sofistas e, particularmente,
Sócrates, os devaneios metafísicos à sobriedade terrena e, particularmente esse
aspecto é que lhe dá ainda mais popularidade. O mesmo Nash explica: “Uma vez
rejeitada a doutrina platônica de dois mundos separados, Aristóteles se
libertou da maior razão de Platão para prender o conhecimento humano somente à
razão [...] no sistema de Aristóteles, as formas (que, para Aristóteles
continuavam a ser o único objeto próprio do conhecimento) não estão em um mundo
no qual elas podem ser apreendidas apenas pela razão. As formas existem como
partes essenciais das coisas particulares que apreendemos por meio de nossos
sentidos. Dessa maneira, Aristóteles rejeitou a extrema disjunção de Platão
entre a razão e a sensação, considerando-as, antes, partes integrais do
processo de conhecimento” (NASH, p. 106-107). Ou seja, as portas para a ciência
estavam abertas. Agora o conhecimento empírico ganha valor. Não é preciso ser
exatamente um filósofo para ter um ‘conhecimento útil’ ou ‘verdadeiro’ em algum
sentido, embora, como veremos (e, genericamente já vimos), há muito de conhecimento
filosófico na proposta de Aristóteles. E, de fato, Aristóteles vai praticamente
dar as boas vindas às ciências naturais*2. Reconhecido o projeto filosófico
de Aristóteles, cientes do panorama de suas ideias, aprofundemo-nos um pouco
mais em cada parte.
SUBSTÂNCIA
Comecemos a ampliar nossa
compreensão de Aristóteles pela compreensão do que ele quer dizer por
‘substância’. Substância é algo que
existe, segundo Ronald Nash expondo Aristóteles: “Dentro deste mundo, a
realidade primária é o que Aristóteles chamou de substância. Por substância,
Aristóteles queria dizer qualquer coisa que exista ou tenha ‘ser’” (NASH, p.
106). Charles Hodge é da mesma opinião e prova a necessidade lógica de se conceber
uma substância: “Por substância entende-se aquilo que existe. É a entidade na
qual propriedades, atributos e qualidades são inerentes e da qual são as
manifestações [...]. É algo mais do que um nome coletivo para certo número de
propriedades que aparecem em combinação.” (HODGE, p. 764) ou ainda “A idéia de
substância se faz necessária. Somos levados a crer que, onde vemos a
manifestação de uma força, existe algo, um ente objetivo que age e do qual a
força é uma manifestação. É por si só evidente que um non-ens não pode agir” (HODGE,
p. 771)*3.
FORMA E
MATÉRIA
Tendo definido o ser, podemos
prosseguir para o próximo tópico. Aqui Nash irá, em um parágrafo, sintetizar o
conceito: “Aristóteles cria que todos os seres, com exceção de Deus e de outros
seres similares, são compostos de dois fatores, os quais chamou de forma e
matéria. Para colocar essa distinção em termos mais simples, a matéria de uma
dada substância é aquilo de que ela ‘ocorre ser feita’. [...] A forma de
qualquer dada substância é o conjunto das propriedades essenciais que fazem o
tipo de coisa que ela é. Tal como a forma de Platão, a forma de Aristóteles é
uma essência imutável. Mas, diferente da de Platão, a forma de Aristóteles é
uma parte essencial da substância que a compõe. Para Aristóteles, não há dois
mundos separados; há somente um mundo, a saber, o universo físico que habitamos
por meio de nossos corpos. Embora as formas existam, elas existem neste mundo
terreno como parte das coisa particulares que encontramos neste mundo” (NASH, p.
106).
Vamos expandir cada ponto.
Primeiramente, a matéria. A
ideia básica de matéria já temos. É a realidade ‘concreta’, aquilo do qual as
coisas são compostas. Em suma, o conceito nos parece simples, Mas, tal como em
Platão, o conceito é bem difícil de conceber. Talvez aqui tenhamos a tradição
pré-socrática na busca pelo arché.
Percebamos o conceito básico:
“A matéria consiste nos elementos físicos que constituem a coisa” (CHALITA, p.
62). Mas Berti e Nash ampliam a compreensão da doutrina aristotélica a níveis
bem mais profundos.
Primeiro, Berti: “A matéria é
constituída, em última análise, pelos quatro elementos terrestres; estes, por
sua vez, transforma-se e passam de um estado a outro. [...] Estas
transformações significam que existe uma matéria comum aos quatro elementos,
que pode ser chamada de ‘matéria primeira’, que não pode, no entanto, existir
fora desses elementos” (PRADEAU, p. 49-50). Uma matéria primeira, da qual se
compõem os quatro elementos (como ensinava Empédocles), existe. Fogo, Água, Ar
e Terra são os elementos que compõem a matéria, segundo Aristóteles. Mas ela
nunca está no seu estado puro, sempre surgindo, na verdade, sob a forma de um
desses elementos. Essa matéria, pois, é uma abstração teórica, como nota Ronald
Nash:
“A doutrina de Aristóteles da matéria primária
pode ser sumarizada em cinco proposições: 1) Matéria primária é um substrato
comum a todas as substâncias. 2) Ela não pode existir por ela mesma, isto é,
sem alguma forma. Portanto, ela é uma abstração teórica. 3) Ela não tem
propriedades distinguíveis sendo, portanto, não conhecível. 4) Ela é eterna;
não pode ser criada ou destruída. 5) Ela é a base última da individuação, é o
que, em última instância, separa coisas diferentes: cadeiras, escrivaninhas, pessoas,
etc.” (NASH, p.115). A matéria primária é algo que está em todas as
substâncias. Mas sempre se encontra em determinada forma. Assim, em seu ‘estado
original’, não é encontrada na natureza. É, portanto, uma abstração teórica.
Não há propriedades, como a matéria platônica ou o ápeiron de Anaximandro. É
uma entidade eterna (aqui ele mostra sua feição ‘pluralista’, mais próximo a
Demócrito).
Mas, além do conceito de
‘matéria’, i. é, o material de que a substância é feita, temos o precioso
conceito de ‘forma’. Nash coloca assim: “Para Aristóteles, essência e forma eram maneiras diferentes de se
referir à mesma coisa” (NASH, p. 107)*4. Chalita completa o conceito: “A
forma é a estrutura interna na qual a matéria está organizada, que a ‘modela’
de modo que a coisa seja reconhecida como é” (CHALITA, p. 62). Isso nos faz
observar o que foi dito alhures, em Ronald Nash. É a matéria que, no final das
contas, diferencia os particulares. Os universais, as formas, subsistem nos
particulares. E é a materialização desses particulares que fazem as substâncias
serem individualizadas. Por individuação Nash quer dizer justamente isso:
“aquilo que distingue uma pessoa do restante da classe dos seres” (NASH, p.
114). Quando temos alguns seres com algumas propriedades essenciais em comum,
formamos as ideias de grupos, espécies, universais.
Quando falamos em ‘formas’
nos lembramos das entidades intelectuais, as ‘Ideias’ de Platão. De fato, o conceito
é muito próximo. Mas Gaarder é pertinente em fazer a diferenciação. Primeiro
ele observa que “Aristóteles entendia por ‘forma’ aquilo que todos os cavalos
têm em comum [...] as ‘formas’ estavam dentro das próprias coisas; as formas
das coisas eram suas características próprias” (GAARDER, p. 123) e, noutro
lugar explica de forma similar: “Aristóteles também não concordava com Platão
no que se refere ao fato de a ‘ideia’ galinha vir antes da galinha propriamente
dita [...] a ‘forma’ galinha está em todas as galinhas e são as características
que distinguem as galinhas” (GAARDER, p. 123). A esta altura acreditamos que o
conceito já tenha sido facilmente capitado. A ‘cadeiridade’ das cadeiras
existe, mas apenas como uma abstração teórica. As propriedades essenciais
formam universais. Mas, se perguntássemos onde é que esses universais estão
poderíamos responder, seguindo Aristóteles, que estão em nossa imaginação, ou,
vendo por outro lado, estão nas próprias coisas: “a forma de determinado objeto
não está em um mundo separado; está presente em cada coisa particular como
parte de tal coisa” (NASH, p. 108). O Estagirita diria que aquelas propriedades
essenciais existem nos próprios particulares. Sua existência ‘fora’ é uma
criação mental, imaginária, que fazemos. Se pegarmos um grupo enorme de
cavalos, iremos perceber que, excetuando um ou outro com defeitos, os cavalos
apresentam sempre as características x, y e z. Portanto, na definição diríamos
que A (cavalo) é x, y e z. O conceito universal de cavalo, ‘A’, foi formado a
partir de características que estão presentes nos exemplares. É nesse sentido
que os comentaristas dizem estarem as forma spresente nas próprias coisas. São
compreensíveis, nesse momento, as observações de Sproul: “Para Aristóteles,
toda substância é uma combinação de forma e matéria. Jamais encontramos forma
sem matéria ou matéria sem forma [...]. Aristóteles não está dizendo que a
forma ou idéia não é real. [...] As formas são reais, e elas existem nas
próprias entidades individuais” (SPROUL, p. 48).
Embora esta citação de
Chalita vá antecipar a discussão epistemológica, acreditamos ser boa para
resumir o que aprendemos até aqui a respeito da substância, da forma e matéria,
e das categorias: “Aristóteles afirmava que cada ser ou objeto tem uma
substância própria, que é o conjunto de todas as suas características
fundamentais, como suas dimensões, qualidades, matéria de que é feito, etc. Por
meio da abstração, o homem conseguiria analisar esses atributos separadamente,
mas que são inseparáveis no ser ou objeto em si. [...] Os seres e objetos
também são determinados por seus acidentes: opostas à substância, as
características acidentais são aquelas que não alteram a essência daquilo que
um ser ou objeto é. [...] Determinar a substância de algo, portanto, é conhecer
segundo Aristóteles” (CHALITA, p. 61).
ATO,
POTÊNCIA E ENTELÉQUIA
Antes de irmos à
epistemologia que, tal como em Platão, está intimamente associada não só à
metafísica como à antropologia filosófica, vamos conhecer outro importante conceito
na filosofia aristotélica, a saber, o conceito de ‘ato e potência’. Aqui
Aristóteles está ciente do fluxo das coisas, de que os seres fluem, conforme
nos atesta nossos sentidos. Ele precisava explicar as mudanças. Tal como no
projeto de Platão, Aristóteles tinha que explicar o porque da matéria se
arranjar de determinadas formas e não de outras. Para Platão, a matéria se
conforma às ideias eternas. Mas, e para Aristóteles? Afinal, as ideias estão
nas próprias coisas, e, a bem da verdade, são as ideias que se amoldam aos
particulares, ou, vendo por outro lado, os particulares geram os universais.
Bom, primeiramente,
compreendamos o importante conceito aristotélico de ‘ato e potência’. O
conceito está estritamente relacionado, na filosofia de Aristóteles, ao assunto
das mudanças. Chalita é o mais sucinto: “Potência e ato. A primeira é uma ou
várias possibilidades, presentes num determinado objeto, de ele ser
transformado em outro. [...] O ato é a realização de uma potência” (CHALITA, p.
62). Esse é o conceito básico. Mas, para elucida-lo, ou, quem sabe, reforçá-lo,
vejamos como Berti e Nash o descrevem. Berti, primeiro, relaciona o conceito de
ato e potência ao das formas, o que é bem interessante: “Aristóteles chama de
‘potência’ [..] a capacidade de assumir uma forma determinada – a condição na
qual se encontra o substrato sem forma; ele chama de ‘ato [...] sua condição
quando ela tomou uma forma; é por isso que a mudança se define também como a
atualização (passagem ou ato) de uma potência” (PRADEAU, p. 49). Ou seja, temos
uma substância e a possibilidade dela tornar-se outra coisa que ainda não é,
mas o é apenas ‘idealmente’. Essa outra coisa que a substância pode passar a
ser é uma forma. Quando a substância, potencialmente outra coisa, torna-se essa
coisa que estava apenas em sua potencialidade, então houve uma atualização.
Nash tenta ser ainda mais claro: “Aristóteles define mudança como a passagem da
potencialidade para a atualidade. [...] Todas as coisas com as quais estamos
familiarizados em nossa experiência ordinária são potencialmente outras coisas.
[...] Mas, conquanto uma coisa possua diversas, talvez muitas, potencialidades,
em um dado momento ela possui apenas uma atualidade. [...] A atualidade de uma
coisa é determinada por sua forma, enquanto sua potencialidade reside na sua
matéria. Toda mudança é a atualização de uma potencialidade de uma dada coisa”
(NASH, p. 111). É importante o acréscimo de Nash de que as coisas podem
encerrar diversas potencialidades, mas, no momento em que ‘olhamos’ para ela,
ela é uma atualidade apenas, e essa atualidade é sua categoria ‘substância’, ou
sua essência, ou, ainda, se preferirem, sua ‘forma’.
Podemos ser ainda mais
investigativos e perceber que Aristóteles ponderou sobre quatro tipos de
mudanças possíveis nos seres. Berti é, dessa vez, quem apresenta o conceito de
forma sucinta: “Toda transformação supõe um substrato, quer dizer, uma matéria
subjacente, que passa de um estado sem forma (estado de ‘privação’) a um estado
em que ela possui uma, quer se trate de um lugar (movimento local ou
transladação), ou de uma qualidade (alteração), de uma dimensão (aumento e
diminuição), ou ainda da forma de uma nova substância (geração e corrupção)”
(PRADEAU, p. 49). Parece que, ao falar dessa mudança e esse estado de
‘privação’, Aristóteles esteja remontando à disputa proposta por Parmênides
quanto à possibilidade e realidade da mudança. Seja como for, para que o
conceito torne-se mais claro, novamente as elucidativas palavras de Ronald
Nash: “Aristóteles distinguiu quatro tipos de mudanças, cada um deles
relacionado a um dos tipos de mudanças das primeira quatro categorias: qualquer
mudança com relação a lugar é locomoção, tal como mover uma cadeira de um lugar
para outro na sala. Qualquer mudança de qualidade é alteração; por exemplo,
alguma coisa fria pode se tornar quente ou alguma coisa verde pode se tonar
vermelha. Qualquer mudança com reação à quantidade é, automaticamente, aumento
ou diminuição, dependendo de se a coisa aumentou ou diminuiu. Mudança com relação
à substância é geração ou corrupção, dependendo de se uma substância existente
é destruída ou se uma nova substância vem a existir” (NASH, p.111).
Sobre a mudança na
substância, podemos, de carona com Nash, ainda, notar mais detalhes. O filósofo
agostiniano nota que ao passo que as demais mudanças são ‘acidentais’, a
mudança na categoria substância, geração ou corrupção, pode encerrar na perda e
criação de propriedades essenciais, tornando algo potencialmente outra coisa: “Uma
mudança com relação a qualquer outro aspecto que não a substância é uma mudança
acidental. [...] Mas uma cadeira pode ser mudada de uma maneira tão radical e
completa que Aristóteles chama tal mudança de substancial. Qualquer coisa que
sofra uma mudança substancial é modificada tão completamente que se torna um
novo tipo de coisa. Aristóteles chama esse tipo de mudança de geração ou de
corrupção, dependendo de se focalizamos a gênese de uma nova coisa ou a
interrupção da existência de uma coisa velha que já exista” (NASH, p. 111-112).
Pensemos, por exemplo, numa semente. Sabemos, de modo geral, quais são as
propriedades essenciais de uma semente. Mas, ao plantarmos ela, dentro de algum
tempo, tomada as devidas medidas, ela se torna algo completamente novo! Há uma
mudança substancial. A planta ou árvore que surge guarda muito pouco das
propriedades da semente. Sua essência passa a ser outra.
Há espaço, ainda, para mais
uma observação de Sproul. “A dinâmica de mudança, para Aristóteles, está ligada
às ideias de potencialidade e atualidade [...] nada tem potencialidade sem
antes ter atualidade. Atualidade vem antes, e é uma condição necessária para a
potencialidade. Não pode haver potencialidade pura ou absoluta. Uma ‘coisa’
dessas seria potencialmente qualquer coisa ou potencialmente tudo, mas na
atualidade não seria nada” (SPROUL, p. 50). Evidentemente não é possível
potencialidade de algo sem forma, ou seja, sem características essenciais, ou
mesmo sem substância. É a velha observação de Parmênides de que ‘ex nihilo,
nihil fit’ (do nada, nada se faz)*5.
Agora, como dissemos, as
mudanças não acontecem de forma completamente aleatória. O que faz uma semente
de determinada coisa, salvo alguma intervenção, seguir determinado rumo e não
outro? Embora o assunto da causalidade propriamente dita seja tema do próximo
tópico, Sproul consegue ser muito resumido, nestas palavras, para encabeçar a
discussão que queremos alavancar agora: “Aristóteles explica que a forma de uma
coisa – o que ele chama de sua ‘enteléquia’ – determina sua materialidade particular
[...] A enteléquia é uma força ou princípio teleológico que rege o processo de
uma coisa vir a ser o que vem a ser [...]. O processo de vir a ser exige uma
causa” (SPROUL, p. 49). É como se uma forma final estivesse presente nas
coisas. A propósito, Nash também usa essa expressão, ‘forma final’, e apresenta
o conceito com a clareza que poucos conseguem: “Em uma de suas mais intrigantes
declarações, Aristóteles diz que a atualidade de uma coisa vem antes de sua
potencialidade. Isso parece significar que tudo tem um propósito embutido. Se
for permitido que se desenvolvam naturalmente, as coisas se desenvolverão na
direção de um propósito embutido. [...] O que Aristóteles chama de enteléquia é
a forma final de alguma coisa, aquilo para o qual a coisa se direciona, aquilo
no que naturalmente se desenvolve, aquilo que naturalmente se torna se nada
interferir no seu desenvolvimento” (NASH, p. 112). As potencialidades seguem
determinados rumos naturais, conforme essa forma final, a enteléquia. Embora a
seguinte citação possa ser reivindicada como pertinente para explicar
simplesmente ‘ato e potência’, há uma parte realmente propícia para a reflexão
do momento: “Aristóteles se interessava pelas mudanças da natureza. A
substância sempre encerra a possibilidade de vir a adquirir determinada forma.
Podemos dizer que a substância se esforça por concretizar uma possibilidade que
lhe é inerente. Assim, para Aristóteles, toda mudança observada na natureza é
uma transformação ocorrida na substância, de uma possibilidade para uma
realidade” (GAARDER, p. 124-125). Gaarder foi muito feliz ao notar que há um
‘esforço’ da substância em concretizar uma possibilidade inerente a ela.
Alhures Gaarder elucida o conceito: “Um ovo de galinha encerra a possibilidade
de se transformar numa galinha. Isto não significa que todos os ovos de galinha
chegam a se transformar em galinhas; afinal, muitos deles acabam na mesa do
café da manhã como ovos fritos, mexidos ou como omelete, sem que a forma
inerente ao ovo chegue a se concretizar. Do mesmo modo, porém, também é claro
que um ovo de galinha jamais irá se transformar num ganso. Esta possibilidade
não é inerente ao ovo de galinha. A forma de uma coisa, portanto, diz tanto
sobre suas possibilidades quanto sobre suas limitações” (GAARDER, p. 125).
Portanto, naturalmente, um ovo tente a tornar-se uma galinha (ou galo). Nessa
tendência natural temos a sua enteléquia, ou seja, aquilo que a coisa tende a
ser. É uma das possibilidades, e parece ser a ‘preferida’ da substância.
A esta altura, já é
perfeitamente compreensível e aproveitável mencionarmos como Durant trabalha a
doutrina. Ele também é particularmente elucidativo, e irá reforçar os conceitos
de matéria e forma, bem como irá falar da ‘enteléquia’ a título simplesmente de
‘forma’: “Sua metafísica surgiu de sua biologia. [...] Tudo é a forma ou
realidade que nasceu de algo que era a sua matéria ou a matéria-prima; e poderá
ser, por sua vez, a matéria da qual nascerão formas ainda mais elevadas. Assim,
o homem é a forma da qual a criança foi a matéria; a criança é a forma, e seu
embrião, a matéria; o embrião, a forma, e o óvulo, a matéria; e assim recuando
até atingirmos, de maneira vaga, a concepção da matéria sem forma alguma. Mas
essa matéria sem forma seria nada, pois tudo tem forma. Matéria, em seu sentido
mais amplo, é a possibilidade de forma; forma é a realidade, a realidade
acabada, da matéria. [...] A forma não é apenas o formato, mas a força que dá o
formato, uma necessidade e um impulso interno que modela a matéria visando a
uma figura e um propósito específicos; é a realização de uma capacidade
potencial da matéria” (DURANT, p. 71).
Temos seguido a metodologia
de deixar, ao máximo possível, os mestres historiadores da filosofia falar em
nosso lugar. Também buscamos reforçar a transmissão do conteúdo pela exposição
do mesmo assunto com palavras diferentes, normalmente de outros autores. Assim
seria a próxima citação, aparentemente deslocada do texto. Entretanto, ela nos
abrirá espaço para discutir os próximos tópicos. Berti coloca a questão nos
seguintes dizeres: “Todo ser tende a realizar completamente sua própria forma.
Aristóteles tem, portanto, uma concepção global da natureza que se pode
qualificar de finalista, ou de teleológica [...] que não resulta da ação de uma
inteligência externa e que não implica uma finalidade única exterior; pelo
contrário, este finalismo é devido à ação de um princípio inconsciente e
interno, tal como a natureza justamente: é este finalismo que se manifesta na
tendência dos indivíduos vivos de se alimentarem e se reproduzirem, assegurando
assim a perpetuação infinita de sua espécie” (PRADEAU, p. 50). O princípio
inconsciente e interno às coisas, ali mencionado, é a enteléquia. Mas,
particularmente dando subsídios para as reflexões de Schopenhauer e Darwin, a
afirmação final nos faz lembrar que Aristóteles era, além de filósofo, um
cientista e, particularmente, um biólogo*6.
“Porque a atenção de
Aristóteles era dirigida para as coisas deste mundo, um dos benefícios de sua
abordagem é quanto ele encorajou o desenvolvimento do pensamento científico”
(NASH, p. 106). Sim, o conhecimento das realidades físicas é assunto primário
em Aristóteles. Já notamos que assim que Aristóteles sai de Assos, já casado,
vai também com seu novo amigo e fiel discípulo Teofrasto*8 para a ilha de Lesbos, onde somos
informados de suas atividades como biólogos. Mas, para Durant mesmo, as
reflexões que vêm a seguir originaram-se no Liceu: “Enquanto caminhava
pensativo pelo seu grande jardim zoológico, Aristóteles acabou convencido de
que a infinita variedade da vida podia ser disposta numa série contínua na qual
cada elo fosse quase indistinguível do seguinte” (DURANT, p. 69). Vejamos o que
Durant quer dizer.
É Gaarder que nos informa da
primeira divisão ontológica que o Estagirita observa nos seres: “No seu projeto
de ‘colocar ordem’ na vida, Aristóteles chama a atenção primeiramente para o
fato de que tudo o que ocorre na natureza pode ser divido em dois grupos
principais. De um lado temos as coisas inanimadas tais como pedras, gotas de
água e torrões de terra. Essas coisas não encerram em si uma potencialidade de
transformação. Segundo Aristóteles, elas só podem se transformar sob a ação de
agentes externos. De um lado, temos as criaturas vivas, que possuem dentro de
si uma potencialidade de transformação” (GAARDER, p.). Portanto, senhoras e
senhores, somente os seres animados possuem enteléquia. Quanto aos seres
inanimados e suas potencialidades, observaremos doravante.
Seres animados são seres
dotados de ‘anima’, que em latim significa alma. Aqui Berti nos traz alguma
luz: “A parte da natureza mais estudada por Aristóteles é aquela que diz
respeito aos seres vivos, plantas, animais e homens. Este seres têm em comum
uma alma (psykhé), o que explica por que esta ciência da alma (que chamamos
hoje de psicologia) faz parte da física; Aristóteles a estuda no tratado Sobre
a alma (De anima). Para ele, a alma não é uma entidade separada do corpo vivo;
ela é a capacidade mesma de viver própria do corpo, em outras palavras, sua
forma de estar vivo; ela é o ‘ato primeiro’ de sua potencialidade de ser vivo”
(PRADEAU, p. 50). Quando Berti fala de ‘ato primeiro’, tendemos a pensar em uma
primeira ‘ação’, mas o termo ‘ato’ pode nos confundir. Berti está nos dizendo
da primeira forma, ou da característica essencial inicial que, inclusive,
encerra a forma final como potência, a enteléquia. A alma, pois, seria esse
algo acoplado ao corpo, a forma inicial e sua enteléquia, essa força misteriosa
que traz uma tendência natural à substância viva.
Durant fala de graduações
quase imperceptíveis na natureza. Gaarder irá resumir o assunto para, em
seguida, o ampliarmos: “Para Aristóteles, a natureza progride paulatinamente
das coisas inanimadas para as criaturas vivas. Ao reino das coisas inanimadas
segue-se primeiramente o reino das plantas, que, ‘em relação ao reino das
coisas inanimadas, parece quase animado, e em relação ao reino dos animais
parece quase inanimado’. Finalmente, Aristóteles divide o reino das criaturas
vivas em dois subgrupos, o dos animais e o do homem” (GAARDER, p. 129-130).
Esse é o conceito base. Temos seres inanimados, o reino das plantas, o reino
animal, e o reino humano. É importante notar que Durant fala de uma mudança
quase imperceptível, ao que Gaarder, novamente, elucida muito bem: “Desta
forma, não existem na natureza divisões realmente estanques. Podemos perceber
uma transição gradual de vegetais simples para plantas mais complexas, de
animais simples para animais mais complexos. Bem no alto desta ‘escada’ está o
homem que, para Aristóteles, vive a plenitude da natureza” (GAARDER, p.).
Pois bem, existem níveis
variados de vida. Berti nos notifica que Aristóteles vai chama-los de ‘ato
segundo’. “A vida se realiza de acordo com os diferentes níveis de atividade
(chamada mais tarde de ‘ato segundo’)” (PRADEAU, p. 50). O que distingue cada
nível, segundo Nash, “é a sua função respectiva e a complexidade de sua
estrutura” (NASH, p. 116).
Bom, para começar, no nível
mais baixo possível, encontramos algo no limiar entre vivo e não vivo: “Na base
da escala, mal podemos separar os vivos dos ‘mortos’; ‘a natureza faz uma
transição tão gradativa do reino inanimado para o animado, que as linhas que os
separam são indistintas e duvidosos’; e é possível que exista um grau de vida
inorgânico... [...]há várias espécies que não podem ser chamadas, com segurança,
de plantas ou de animais” (DURANT, p. 69).
Logo temos nosso primeiro
nível de vida, do reino vegetal. Berti, breve, nos informa que “esses níveis
são, para as plantas, a nutrição e a reprodução” (PRADEAU, p. 50). É a forma de
vida mais simples, como nos informa Nash: “A forma mais simples de vida é
encontrada nas plantas” (NASH, p. 116). Basicamente, pois, o que as distingue
dos seres inanimados é sua capacidade de crescimento e reprodução.
Essencialmente, pois, na concepção de Aristóteles, a vida envolve isso. Por
isso Nash afirma: “As funções da alma vegetativa ou nutritiva envolvem os
processos básicos da vida” (NASH, p. 116).
Continuamos com Nash, e ele
nos informa que “Uma vez que podem desempenhar todas essas funções, os animais
possuem uma alma nutritiva [...]. Mas os animais podem desempenhar funções que
estão além do que as plantas são capazes, como percepção e moção. Estas são
funções da alma sensível” (NASH, p. 116-117). Em suma, pois, no nível de vida
animal “é preciso acrescentar para os animais o movimento e a percepção”
(PRADEAU, p. 50). Além de crescer e se reproduzir, os animais se movimentam e
possuem, via de regra, os cinco sentidos, ou a maioria deles, ou mesmo algo
similar a eles.
Por fim, chegamos ao nível
mais complexo e avançado e forma de vida: “para os homens, eles [níveis de
vida] compreendem também o pensamento e suas atividades conexas” (PRADEAU, p.
50). Nash amplia: “Os seres humanos também têm uma alma nutritiva [...]. Como
os animais, os seres humanos também possuem uma alma sensível. Podemos perceber
e nos mover. Mas possuímos também um nível de funcionamento não encontrado nos
níveis dos animais e das plantas – o raciocínio” (NASH, p. 117). Sobre o homem
Gaarder diz: “Uma característica muito especial, que só ele tem: a capacidade
de pensar racionalmente. Por isso [...] o homem possui uma centelha da razão
divina. Isso mesmo... eu disse ‘divina’” (GAARDER, p. 130). Iremos abordar a
teologia de Gaarder adiante. Retenhamos que a racionalidade, pois, é aquilo em
comum que, segundo Aristóteles, o homem tem para com Deus*9.
Nash termina fazendo três
observações que reforçam muito bem o conteúdo: “Assim, temos o seguinte: 1) os
seres humanos possuem todos os três níveis de alma; os animais carecem da alma
racional; as plantas possuem apenas a alma vegetativa. 2) Cada nível inferior
da alma é necessário para os níveis superiores. Isto é, um ser vivente não
poderia possuir uma alma sensível sem que possuísse também uma alma vegetativa.
[...] 3) À medida que se ascende na hierarquia das formas vivas, encontram-se
formas de vida cada vez mais complexas” (NASH, p. 117). Podemos imaginar cada
nível como um conjunto, e nos níveis superiores estão contidos nos níveis
inferiores. Assim, é possível pertencer ao grupo maior, A, sem pertencer aos
grupos B e C, contidos no grupo A. É possível pertencer a B sem pertencer a C.
Mas não é possível pertencer a B sem pertencer a A, e nem a C sem pertencer a A
e B.
Alguém poderia imaginar, pois
que os seres vivos dos níveis superiores poderiam ter mais que uma alma. A isso
Berti repudia como engano: “No entanto, a categoria superior contém, sempre,
potencialmente a categoria inferior; é por isso que há somente uma única alma
em cada ser vivo” (PRADEAU, p. 50). As propriedades inferiores são ‘transmitidas’
às superiores.
A esta altura, principalmente
pelo fato de Aristóteles conhecer bem os filósofos que o precederam, (pensamos,
particularmente, em Anaximandro, Empédocles e Anaxágoras), podemos suspeitar de
que Aristóteles esteja ‘fedendo a Darwin’ aqui. E Durant é especialmente sagaz
ao notar isso, embora note que Aristóteles tenha rejeitado a doutrina da
evolução: “Em meio, porém, a essa assombrosa riqueza de estruturas, certas
coisas se destacam de maneira convincente: a vida tem aumentado continuadamente
no que se refere a complexidade e poder; a inteligência tem progredido em
correlação com a complexidade da estrutura e a mobilidade da forma; tem havido
uma crescente especialização de funções e uma mobilidade da forma; tem havido
uma crescente especialização de funções e uma continuada centralização do
controle fisiológico. A pouco e pouco, a vida criou para si mesma um sistema
nervoso e um cérebro; e a mente avançou, resoluta, para o domínio de seu meio
ambiente. O detalhe notável, aqui, é que, com todas essas gradações e
similaridades saltando aos seus olhos, Aristóteles não chegou à teoria da
evolução. Ele rejeita a doutrina de Empédocles, de que todos os órgãos e
organismos são uma sobrevivência dos mais aptos, e a ideia de Anaxágoras de que
o homem tornou-se inteligente ao usar as mãos para a manipulação, e não para se
movimentar; Aristóteles pensa, ao contrário, que o homem usou as mãos dessa
maneira porque se tornara inteligente” (DURANT, p. 69)*10.
Resumindo, vamos dar a
palavra a Gaarder: “Quando Aristóteles divide os fenômenos da natureza em
diferentes grupos, ele parte das característica das coisas; melhor dizendo,
daquilo que elas são capazes ou daquilo que elas fazem. Tudo o que vive
(plantas, animais e pessoas) tem a capacidade de se alimentar, crescer e se
multiplicar. Os animais e os homens têm, além disso, a capacidade de se
locomover na natureza. E todas as pessoas têm, somada a tudo isto, a capacidade
de pensar – ou melhor, a capacidade de ordenar suas impressões sensoriais em
diferentes grupos e classes” (GAARDER, p. 130).
CAUSALIDADE
Chalita estaria discutindo o
tema de ‘ato e potência’, mas acaba trazendo à baila o assunto da causalidade: “Segundo
Aristóteles, tudo tende a passar da potência ao ato; tudo se move de uma para outra
condição. Essa passagem sempre se daria pela ação de forças que se originam de
diferentes motores, isto é, coisas ou seres que promoveriam essa mudança”
(CHALITA, p. 62). Notamos que o que causa as mudanças nos seres vivos é a
enteléquia. Mas, e nos seres inanimados? É certo que eles mudam, mas quais são
as causas? “O primeiro objeto ou conjunto de objetos que Aristóteles buscou
conhecer foi a natureza (phisis), quer dizer, o conjunto dos corpos em devir
que apresentam uma evolução totalmente autônoma; aliás, é isto o que distingue
as produções da atividade humana, quer dizer os objetos artificiais.
Aristóteles sustenta que os objetos podem derivar de quatro categorias de
causas” (PRADEAU, p. 48). Ao passo que objetos artificiais surgem por meio da
intervenção não somente humana como animal em geral, também temos o surgimento
de coisas por meio de ações naturais. Isso faz-nos abrir caminho para as
reflexões de Aristóteles quanto aos quatro tipos, distintos porém não
mutuamente excludentes, de causas*10. Quando acontece uma
transformação, uma mudança qualquer, podemos pensar em uma ou mais das quatro causas,
ou explicações, que virão a seguir.
Primeiro, Sproul afirma que “as
mudanças são sempre operadas em coisas que já têm uma combinação de forma e
matéria, que são transformadas em algo novo ou diferente. O pintor não cria uma
obra prima ex nihilo” (SPROUL, p.49). Aqui já temos espaço para pensar em dois
tipos de causas: materiais e formais.
A causa material é aquilo do
qual algo é feito, a matéria que compõe a substância. Já observamos, mas vale a
pena observar, que “as causas materiais
dos objetos naturais são, em última análise, os quatro elementos dos corpos
terrestres: a água, o ar, a terra e o
fogo, associados de várias maneiras segundo as formas dos objetos de que eles
constituem a matéria” (PRADEAU, p.). Notamos, também, que, a despeito disso, a
noção de que coisas são feito de coisas, podendo adotar o modelo atômico
atualmente concebido, é perfeitamente plausível e compatível com Aristóteles. Não
é muito difícil entender a essência do que Aristóteles quer dizer aqui. Toda
mudança, como apontou Sproul, é mudança em algum material.
Na causa final é que temos os
fundamentos para a quinta via para o conhecimento de Deus em Tomás de Aquino, e
para o posteriormente denominado ‘argumento teleológico’ para a existência de
Deus.
Berti parece-nos dizer que
até mesmo a enteléquia é movida, originalmente, pelo mesmo que move os seres
inanimados: “Geralmente a causa destas transformações é a própria natureza,
enquanto princípio interno do movimento e do repouso; mas, por sua vez, a
natureza está submetida à ação motriz desencadeada pelo movimento dos céus
(principalmente do sol, que determina a sucessão das estações e, por
conseguinte, a alternância do calor e do frio)” (PRADEAU, p. 49). Portanto, os
movimentos dos astros causam os movimentos na terra, gerando as energias e
propulsões que movem as coisas. Longe de ser uma astrologia mística e barata, a
ideia faz sentido. Podemos pensar na influência gravitacional que a lua exerce
sobre a Terra, fenômenos observado nas marés, bem como os movimentos provocados
pelo calor solar e as várias mudanças nos seres decorrentes dessa emissão de
calor.
Encerrando esse assunto e
levantando outro, encerremos mais uma sessão com Gaarder: “Em algumas
passagens, Aristóteles explica que deve haver um Deus que colou em marcha todos
os movimentos da natureza [...]. Para Aristóteles, os movimento das estrelas e
dos planetas comandavam os movimentos aqui na Terra. Mas devia haver alguma
coisa que fazia os corpos celestes se movimentarem. Esta coisa Aristóteles
chamava de o primeiro impulsor, ou Deus” (GAARDER, p. 130-131).
O MOTOR
PRIMEIRO
E o que pensa Aristóteles
sobre Deus? Esse é um dos aspectos mais controvertidos da filosofia de
Aristóteles, mas, sem dúvida, ele nos concedeu reflexões extasiantes nesse
quesito. Usemos Chalita para sintetizar o assunto para, em seguida, expandi-lo:
“Se todo o universo sofre transformações, o estagirita afirmava que deveria
haver um primeiro motor, imóvel e imutável, que não seria nada em potência, mas
ato plenamente realizado [...] de onde parte todo o movimento do universo,
todas as transformações” (CHALITA, p. 62). Essa é, em suma, a famosa doutrina
do primeiro motor de Aristóteles. Ela foi postulada, não por piedade da parte
de Aristóteles, mas por uma necessidade metafísica a fim de que seu sistema não
ruísse, como observa Ronald Nash: “Aristóteles não foi um homem especialmente
religioso [...] Aristóteles não cultuava ou orava a seu deus. Ele cria em um
ser supremo porque pensava que certas coisas no mundo não podiam ser explicadas
sem a existência de um deus. Seu deus era uma necessidade metafísica, um
conceito requerido para evitar que seu sistema contivesse alguns grandes
lapsos” (NASH, p. 122). Quais lapsos são esses? Explicaremos.
Todo efeito tem uma causa.
Daí podemos postular que toda mudança (um efeito) tem uma causa eficiente. Mas,
ao pensarmos dessa forma, iremos cair num retrocesso sem fim de causas, o que
seria uma absurdo. É por isso que Sproul diz: “Aristóteles compreendeu que,
para fugir do atoleiro ilógico do regresso infinito, a causa última do
movimento tem de ser uma causa não causada ou um motor não movido” (SPROUL, p.
51). Portanto, há de haver uma causa inicial que não é causada. A questão é,
como seria essa causa? Daí Aristóteles começa a raciocinar.
Se essa causa fosse material,
daí temporal e espacial, então ela seria algo mutável por definição, ou, em
termos aristotélicos, seria uma substância, como as demais, com potência, que
significa que ela tem potencial de mudança. Mas nada moveria, afinal, ela tem
de ser um motor imóvel. Sendo assim, tem de ser uma causa imutável, sem
variação de mudança. Seria, portanto, ‘ato puro’, ou seja, atualidade pura, uma
forma que não admitiria potência qualquer. Nash nota isso: “Aristóteles foi
forçado a concluir que a causa última do universo tinha de ser a forma pura,
não misturada com nenhuma matéria. A matéria, Aristóteles pensava, é sinônima
de potencialidade. Mas potencialidade implica a possibilidade de mudança, e
assim, imperfeição. Portanto, o deus de Aristóteles seria pura atualidade, em
outras palavras, forma sem matéria” NASH, p. 122). A noção de que essa causa
última tinha de ser um ser perfeito salta sobre o conceito formulado desse
ente. Como ele é imutável, ele é, portanto, perfeito, raciocina Aristóteles.
Trata-se do ente último, da perfeição ontológica, acima de todos os seres. Mas,
o que é ser perfeito? Poder-se-ia conceber um ser inferior que, por sua vez,
fosse imutável? Aristóteles não ascendeu à sutileza do raciocínio de Agostinho
e, posteriormente mais elaborado, de Anselmo. Porém, protelemos, por hora, e
continuemos com nossa compreensão do Deus de Aristóteles.
Dissemos que esse motor
imóvel deve ser atualidade pura. Também dissemos que não pode haver
potencialidade sem atualidade. Mas é bem possível que exista ato sem potência.
O ato precede a potência, por necessidade lógica. O deus aristotélico é ato
puro. É, pois, mais que o primeiro motor. O conceito é mais profundo. Estamos
seguindo, aqui, os seguintes dizeres de Sproul: “A causa fundamental do
movimento, segundo Aristóteles, tem de estar arraigada no ser puro ou na
atualidade pura. Ela tem de ser eterna, imaterial e imutável. O motor não
movido não é simplesmente o primeiro em uma série de motores ou causas. [...] A
atualidade tem de preceder a potencialidade, assim como o ser tem de preceder o
vir a ser. Portanto, ser precede vir a ser, por necessidade lógica” (SPROUL, p.
51). Percebam o conceito. Deus é ato puro, ou seja, uma forma sem
potencialidade alguma, o que é perfeitamente lógico. Reforcemos o conceito com
Ronald Nash: “Pode a forma existir sozinha? A resposta de Aristóteles é sim e
seu principal exemplo de forma pura é seu deus. Aristóteles entendia a
perfeição de Deus de uma maneira que tornava impossível qualquer mudança no ser
de Deus. Isso significa que, para Aristóteles, Deus não possui potencialidade,
somente atualidade” (NASH, p. 114).
A imutabilidade é necessária
porque mover-se, de qualquer maneira, implica em imperfeição. “Um ser de
atualidade pura e absoluta não tem potencial irrealizado. Não está aberto a
mudança, crescimento ou mutação. Um ser sem potencialidade e com atualidade
pura, por não ter mudança, não pode ter nenhum tipo de movimento. Esse conceito
gerou a ideia de Aristóteles de ‘motor não movido’ (SPROUL, p. 50). Se esse ser
move-se de alguma maneira, concebeu Aristóteles, ele estaria buscando algo,
mudando de alguma forma, o que implicaria em imperfeição. Além disso,
reforçamos, uma mudança nesse deus demandaria a explicação do porque ele mudou,
ou seja, uma causa final, bem como uma causa eficiente que o tenha levado à
mudança. Isso Aristóteles não podia admitir*12: “Se esta causa última se movesse
ou mudasse de qualquer maneira, não poderia, então, ser a causa última, pois
nos veríamos forçados a perguntar porque mudou e o que o mudou” (NASH, p. 122).
Não podemos conceber que
Aristóteles tenha postulado que seu deus seria a causa material do mundo
também. Ele é a causa eficiente e formal de todo o universo, mas o estagirita
concebia facilmente a eternidade da matéria. A matéria eterna, óbvio, é a causa
material do mundo. Deus é a necessidade lógica das causas eficientes e formais:
“No entanto, existe um Deus, embora
talvez não o deus simples e humano concebido pelo perdoável antropomorfismo da
mente adolescente. Aristóteles aborda o problema a partir do velho enigma sobre
o movimento [...] Ele não aceita a possibilidade de que o movimento seja tão
desprovido de começo quanto, segundo sua concepção, a matéria: a matéria pode
ser eterna, porque é apenas a perene possibilidade de futuras formas; mas
quando e como começou o vasto processo de movimento e formação que, finalmente,
encheu o amplo universo de uma infinidade de formas? Não há dúvida de que o
movimento tem uma fonte, diz Aristóteles; e se não quisermos mergulhar
tristemente em um regresso infinito, tornando a pôr no lugar o nosso problema,
passo a passo, indefinidamente temos que pressupor a existência de um agente
motor imóvel [...], um ser incorpóreo, indivisível, sem espaço, assexuado, sem
paixão, sem alteração, perfeito e eterno” (DURANT, p. 72).
É isso mesmo que acontece.
Deus não cria o mundo como na concepção teológico-cristã. Mas se ele não pode
se mover, como ele move o mundo? Essa é a nova questão que temos de abordar.
Deus é causa eficiente enquanto causa final. Enquanto Nash destaca a
problemática e enuncia a solução que apontamos: “O deus de Aristóteles não
podia agir sobre o mundo como causa eficiente porque isso implicaria
potencialidade nele. Preso em seu próprio sistema, Aristóteles foi forçado a
dizer que seu movedor imóvel só pode produzir mudança no mundo sendo uma causa
final, isto é, como um objeto do desejo” (NASH, p. 122). Sproul complementa: “O
‘deus’ de Aristóteles não ascendeu ao nível do Deus judeu-cristão. Ele
permaneceu uma força impessoal. Aristóteles não tinha uma doutrina da criação.
Para ele, o motor não movido é a forma última da matéria eterna, que move o
mundo não pela força, mas pela atração, do mesmo modo como a luz atrai as
mariposas. [...] E o motor não movido é a causa final que dirige todas as
coisas para o seu fim apropriado, seu propósito teleológico fundamental”
(SPROUL, p. 51). Por fim, Durant diz, tentando expressar-se como Nash e Sproul,
que Deus seria a enteléquia do mundo: “Deus não cria o mundo, mas o movimenta;
e o movimenta não como uma força mecânica, mas como o motivo total de todas as
ações do mundo [...] Ele é a causa final da natureza, e o impulso e o propósito
das coisas, a forma do mundo, o princípio da vida deste mundo, a soma de seus
processos e poderes vitais, a meta inerente de seu crescimento, a estimulante
enteléquia do todo” (DURANT, p. 72). Dessa forma as ações naturais sobre seres
inanimados não parecem ser tão despropositais assim. E a enteléquia tem seu
fundamento no ‘magnetismo ontológico’ que Deus exerce sobre as almas. Embora
poeticamente seja belo, dá a entender que o mundo anseia, em algum sentido, por
Deus. Que tipo de atração magnética é essa?*13
Ele é, pois, inerte? Em certo
sentido, sim. Poderíamos pensar apenas em uma entidade ontológica impessoal, uma ‘energia’. Seria possível. Mas
Aristóteles a concebe como autoconsciente. Nash explica: “...a única coisa que
o deus perfeito de Aristóteles pode fazer é pensar. Mas, uma vez que ele é
perfeição imutável, segue-se que ele pode pensar somente sobre o que seja
perfeito e imutável. Isso significa que ele pode pensar apenas sobre si mesmo”
(NASH, p. 122). Durant diz ser essa autoconsciência uma inconsistência, e
amplia o conceito: “No entanto, com sua costumeira inconsistência, Aristóteles
representa Deus como um espírito autoconsciente. Um espírito muito misterioso,
pois o Deus de Aristóteles nunca faz coisa alguma [...] é uma atividade tão
pura que nunca age. É absolutamente perfeito; portanto, não pode desejar coisa
alguma; portanto, nada faz. Sua única ocupação é contemplar a essência das
coisa; e como ele próprio é a essência de todas as coisas, a forma de todas as
formas, sua única tarefa é a contemplação de si mesmo” (DURANT, p. 72). Isso
mesmo, o deus de Aristóteles é um ser que paira eternamente a pensar em si
mesmo.
As diferenças para com o
‘Deus cristão’ são gritantes. A título de completude, não podemos encerrar essa
sessão sem mencionar a diferença essencial: “As reflexões de Aristóteles nos
levaram [...] a um conceito de um deus radicalmente transcendente, totalmente
outro, o qual parece que não pode ter nenhum relacionamento direto, pessoal e
essencial com as pessoas ou com o mundo. O Deus cristão é transcendente. Mas,
em oposição a pensadores como Aristóteles, o Deus da fé cristã é também
imanente no sentido de que ele está com seu povo e com sua criação” (NASH, p.
122).
ANTROPOLOGIA
E EPISTEMOLOGIA
Já mencionamos a questão do
significado de ‘alma’ para Aristóteles quando falamos de sua biologia. Vamos,
agora, ampliar nossos conhecimentos sobre a concepção antropológica de
Aristóteles. Basicamente seguiremos Ronald Nash, que fez uma brilhante exposição
do assunto. Para começo de conversa, aqui, novamente, Aristóteles busca
subverter Platão: “Aristóteles rejeitou também a separação radical de Platão
entre alma e corpo. [...] Para ele, os humanos não são compostos de duas
substâncias radicalmente diferentes, o corpo e a alma. São, antes, uma unidade
holística; ambos, corpo e alma, são aspectos essenciais do ser humano” (NAH, p.
107).
Já vimos que o homem é um
animal racional, um ente dotado de alma. Nash deixa mais clara a definição de
homem em termos aristotélicos: “Seres humanos são substâncias. Nós também somos
compostos de forma e matéria. A matéria é nosso corpo. Nossa forma, essa
propriedade essencial que nos faz seres humanos, é nossa alma. Naturalmente,
nós temos também propriedades acidentais. Cabelo é uma propriedade
não-essencial, tal como a cor de nossa pele ou de nossos olhos” (NAHS, p. 108).
Mas a alma não é exatamente uma substância diferente*14. É uma propriedade da substância,
ou melhor, é a categoria substância (substância segunda) que os seres vivos
têm, que lhe garante os atributos da vitalidade (reprodução, crescimento,
locomoção, percepção e, exclusivamente no homem, intelecção). Esse é o conceito
básico. Por enquanto, nenhum problema, não é? Aparentemente não, mas aí
começarão os problemas.
Durant, ao buscar explicar o
que é a alma para Aristóteles, enuncia um ensinamento sobre a alma no
Estagirita que poderá causar-lhe problemas: “A alma é todo o princípio vital de
qualquer organismo, a soma de seus poderes e processos. Nas plantas, a alma é
meramente uma força nutritiva e reprodutora; nos animais, é também uma força
sensitiva e locomotora; no homem, é também a força da razão e do pensamento. A
alma, como a soma das forças do corpo, não pode existir sem ele; os dois são
como a forma e a cera, separáveis apenas em pensamento [...]. a alma não é
colocada no corpo [..] Uma alma pessoal e particular só pode existir no seu
próprio corpo. Apesar disso, a alma não é material, como afirmava Demócrito;
tampouco morre por inteiro. Uma parte do poder racional da alma humana é
passiva: está vinculada à memória, e morre com o corpo que continha esta; mas a
‘razão ativa’, o puro poder de pensamento, é independente da memória, não sendo
tocado pela decadência. A razão ativa é o universal, que se distingue do
elemento individual do homem; o que sobrevive não é a personalidade, mas suas
afetações e desejos transitórios, mas a mente em sua forma mais abstrata e
impessoal” (DURANT, p. 73). Percebem? Uma ‘parte da alma’ subsiste e faz parte
de uma alma universal. Em certo sentido, a alma subsiste após a morte. Mas
Aristóteles não havia dito que ela não era uma substância diferente no homem?
Aqui parece-nos muito bem uma substância individual, particular e autônoma.
Bom, vamos ampliar a compreensão desse assunto.
A divisão de duas partes da
alma são de cunho epistemológico, e seguem os níveis de vitalidade. Encabecemos
a discussão com Nash: “Aristóteles distinguiu entre alma [...] e mente [...]. A
partir daí, ele criou uma distinção entre dois aspectos da mente humana,
chamando-os de intelecto passivo e intelecto ativo. [...] Há uma parte da
mente, segundo Aristóteles, que é passiva no sentido de que ela recebe
informação dos sentidos. Outra parte da mente é ativa no sentido de que ela age
sobre aquilo que recebe do intelecto passivo. Aristóteles explicou nosso
conhecimento do mundo como um produto da interação desses aspectos da mente
[...]. Tal imagem sensível de uma coisa particular ainda não configura
conhecimento, mas é apenas conhecimento em potencial. [...] O intelecto ativo
abstrai, da particular imagem sensível, a forma (ou o elemento essencial), a
qual pode ser, unicamente, o objeto de conhecimento. O conhecimento humano,
portanto, depende de duas coisas: do intelecto passivo, que recebe informação dos
sentidos, e do intelecto ativo, que, unicamente, desempenha a função crucial da
abstração que isola a forma da coisa particular que foi percebida” (NASH, p.
115-116).
Percebam que o intelecto
passivo é comum aos homens e demais animais. É a recepção das informações
sensoriais. Nesse quesito Aristóteles antecipa Locke e Hume na suposição de que
todo conteúdo da mente humana é produto das informações sensoriais: “Aristóteles
nos chama a atenção para o fato de que não existe nada na consciência que já
não tenha sido experimentado antes pelos sentidos. Platão poderia ter dito que
não existe nada na natureza que não tivesse existido antes no mundo das ideias.
Aristóteles achava que, desta forma, Platão estava duplicando o número de
coisas” (GAARDER, p. 123-124)*15. Berti é particularmente profundo
ao analisar o processo epistemológico envolvido no empirismo: “ela [a percepção
empírica] consiste na atualização da capacidade de perceber [..] e,
simultaneamente, da possibilidade de ser percebido (própria do objeto
sensível). Esta atualização resulta da ação de uma causa já atuante, como, por
exemplo, a luz para a visão ou a vibração do ar para a audição. Graças a ela, o
órgão do sentido concernido assume a forma do objeto, mas não a sua matéria. É
pela percepção e graças à imaginação (phantasia) que se forma a imagem
(phantasma), conservando a memória como lembrança” (PRADEAU, p. 50-51).
Percebam o que acontece no ato do conhecimento empírico. Nossos órgãos
sensíveis potencialmente podem perceber
(e aqui Aristóteles pressupõe a perfeita competência desses órgãos). O mundo
sensível tem a propriedade de ser perceptível a nossos órgãos (outra
pressuposição). Essas são as causas formais. A luz parece, no caso da visão,
e.g., ser a causa eficiente, aquilo que produz a atualização de nosso órgão
oftalmológico. O formato do objeto percebido é captado pelo órgão, mas não sua
matéria. Forma-se um ‘fantasma’ na alma. É como se a alma fosse a causa
material, onde é impressa a imagem captada. A alma tem a capacidade de imaginar,
e ela o faz mediante o que lhe é impresso. Eis o mecanismo
epistemológico-empírico de Aristóteles. Eis o que até animais podem fazer. Eis
o trabalho do intelecto passivo.
Chalita nota que “Forma e
matéria, juntas, mostram-se ao homem através das informações captadas por
nossos sentidos” (CHALITA, p. 62). Mas já observamos que a ‘forma’, no sentido
aristotélico, é o trabalho de uma abstração, um processo ativo da alma. É aqui
que entra a discussão sobre o intelecto ativo. Gaarder nos explica do que se trata:
“Mas nós também temos uma razão inata. Temos uma capacidade inata de ordenar em
diferentes grupos e classes todas as nossas impressões sensoriais. É assim que
surgem conceitos [...]. Aristóteles não negava que o homem tivesse uma razão
inata. Muito pelo contrário: para ele, a razão era precisamente a
característica mais importante do homem. Só que nossa razão permanece
totalmente ‘vazia’ enquanto não percebemos nada. Uma pessoa, portanto, não
possui ‘ideias’ inatas” (GAARDER, p. 124)*16. A distinção do homem para com os
animais reside no seu intelecto ativo, na razão, que tem o poder de organizar
as informações empíricas, de detectar as abstrações e tudo o mais. Berti está,
novamente, com a palavra: “a capacidade de se apropriar de uma forma, quer dizer,
a intelecção, é simultaneamente a atualização da faculdade que permite
compreender – própria do intelecto (por esta razão, qualificado de potencial ou
passivo) - a atualização da faculdade de
ser compreendido – própria da forma. Aí também a atualização deve resultar de
uma causa já atuante, que Aristóteles chama de intelecto ativo, ou produtivo; e
exatamente porque este intelecto é sempre atuante, ele aparece separado da alma
intelectiva, ou eterna. No entanto, Aristóteles fala muito pouco a esse respeito
para que se possa compreender se este objeto é individual ou se, como tal, ele
implica a imortalidade da alma intelectiva de cada homem” (PRADEAU, p. 51). A
abstração teórica, da qual já muito falamos, é uma atividade exclusivamente
humana. É nossa razão. Nela está compreendido dois processos de atualização
também. Um é o da potência da alma humana de compreender, de abstrair as
formas. A outra é o do objeto de ser compreendido, abstraído. O agente aqui é o
intelecto ativo, a razão. “E assim vamos nós pelo mundo, colocando as coisas em
gavetas diferentes [...] nas nossas cabeças estabelecemos a diferença entre
coisas” (GAARDER, p. 127).
Agora, há quem chegue ao
cúmulo de dizer que não há categoria alguma, que todas as coisas são
particulares e que, portanto, toda ‘classe’ de coisas não passa de confusão e
engano. Como exemplo temos “...H. G. Wells quando ele insiste que todas as
coisas separadas são ‘únicas’, e não há em absoluto categorias. Isso também é
meramente destrutivo. Pensar significa conectar coisas, e o pensar é bloqueado
se elas não puderem ser conectadas. [...]. Assim, quando o sr. Wells diz (como
o fez nalgum lugar) que ‘Todas as cadeiras são completamente diferente’, ele
não profere apenas uma afirmação falsa, mas uma contradição em termos. Se todas
as cadeiras fossem completamente diferentes, você não poderia chama-las de
‘todas as cadeiras” (CHESTERTON, p. 59).
Observem que alguma coisa da
alma ‘morre’ com a morte do homem. Esse é, como observou Berti, um tema muito
controvertido na filosofia de Aristóteles. Nash nos conta sobre a problemática:
Quanto à relação entre a alma e o corpo, “Aristóteles pensava que a relação
fosse mais próxima do que a de Platão. Contudo, as interpretações do que
Aristóteles queria dizer têm ido desde compreensões que o consideram um
fisicista, até aquelas que apresentam sua posição como similar à perspectiva
holística do ser humano adotada pelo Novo Testamento. [...] A questão
importante é se, no sistema de Aristóteles, a consciência terminaria com a
morte do corpo. [...] Um grande número de passagens do De Anima parece
incompatível com a crença em uma sobrevivência pessoal após a morte” (NASH, p.
117-118). Uma sobrevivência ‘impessoal’, pois, parece ser a posição mais
compatível com o que pensava Aristóteles.
Para não sermos acusados de
estarmos elencando uma discussão inédita, reforcemos a problemática com Nash,
novamente: “Aristóteles disse coisas misteriosas sobre o intelecto ativo. Por
exemplo, ele declarou que o intelecto ativo é ‘separável e imortal’. [...] O
grande desafio para os intérpretes de Aristóteles é entender como tudo isso
pode ser conciliado com o restante da psicologia do filósofo. [...] Enquanto o
intelecto passivo perece quando o corpo morre, o intelecto ativo é diferente”
(NASH, p. 118-120). Portanto, aquela racionalidade detentora do poder de
distinguir e classificar, justamente a ‘centelha divina’ no homem, sua
racionalidade, parece permanecer viva, embora sem as ‘impressões’ na alma, ou
seja, sem o ‘intelecto passivo’, que guarda os ‘fantasmas’, as imagens e
experiências colhidas. Portanto, morre a pessoalidade. Mas subsiste algo
impessoal.
Nash nos conta sobre três
tentativas de interpretar Aristóteles nesse ponto. A que lhe parece mais
plausível é a que iremos citar: “Durante o terceiro século, o filósofo Plotino
(205-270) interpretou o intelecto ativo como um princípio cósmico de
inteligência ao qual todo ser humano está relacionado. Na morte, o intelecto
dos seres humanos individuais é reabsorvido pela mente cósmica [...], a qual é
eterna e impessoal [...] Séculos depois, de Plotino, sua teoria reapareceu no
pensamento do árabe aristotélico Averróis (1126-1198) e dos seus seguidores cristãos,
com os quais Tomás de Aquino debateu. [...] a posição de Aquino é errada e a
leitura de Aristóteles feita pelos averroístas seria, provavelmente, mais
acertada” (NASH, p. 120-121).
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*1 Durant é particularmente
provocador ao notar que Aristóteles era, também, um grande amante das
abstrações, tal como o mestre: “No entanto, com o usual humor da história, o
jovem guerreiro assume muitas das qualidade do velho mestre que ele ataca.
Sempre temos em nós um grande estoque daquilo que condenamos. [...] Aristóteles
é tão implacável com Platão por que existe muito de Platão nele; também ele
continua um amante de abstrações e generalidades, traindo repetidas vezes o
fato simples por alguma teoria ilusoriamente enfeitada, e compelido a uma luta
contínua para conquistar sua paixão filosófica por explorar o empíreo” (DURANT,
p. 65).
*2 Já notamos, em artigos anteriores,
que o conhecimento de viés científico estava presente já nos pré-socráticos. Já
em Tales de Mileto, por exemplo, temos notáveis avanços científicos. Cf.: http://panaceiateoreferente.blogspot.com.br/2014/04/as-figuras-de-mileto.html.
*3 Essa questão pode evocar a questão cosmológica que já abordamos
aqui: http://panaceiateoreferente.blogspot.com.br/2014/04/gafes-pra-la-de-comuns-na-tentativa-de.html.
Uma questão que nos surge é a
questão das características materiais fazerem parte das propriedades
essenciais. A coisa é feita de matéria. Mas o arranjo material, definido pela
forma, não é, também, uma propriedade da substância primária?
*4 As Categorias, i. é., os
predicados das substâncias já foram estudados no texto sobre a lógica
aristotélica. Aqueles conceitos devem estar dominados para compreender a metafísica
de Aristóteles.
*5 Escrevemos sobre isso aqui: http://panaceiateoreferente.blogspot.com.br/2014/04/gafes-pra-la-de-comuns-na-tentativa-de.html.
*6 Já não se fazem biólogos como
antigamente, não é mesmo Richard Dawkins?
*7 Os avanços e especulações de
Aristóteles nos campos da biologia não se restringem ao que iremos expor aqui.
O espaço nos impede de levantar esses dados. Para obter essas informações
sugerimos que se procure no ‘História da Filosofia’ de Durant, páginas 69-71; e
no livro homônimo de Pradeau, páginas 51-52.
*8 “Seu discípulo, Teofrasto (371?
-288? a. C.) é considerado o pai da botânica” (CHALITA, p. 66).
*9 Não é que há uma linha
antropológico-teológica que segue essa mesma concepção? Como exemplo, temos Vincent
Cheung e W. Gary Crampton. Conferir a ‘Introdução à Teologia Sistemática’ do
primeiro, pp. 165-168; e ‘Em Direção a Uma Cosmovisão Cristã’ do segundo, com
co-autoria de Richar Bacon, p.24. Em dissertar sobre antropologia-teológica
iremos abordar melhor o tema.
*10 Numa outra oportunidade iremos
expor Darwin.
*11 É interessante observar que aqui
está presente justamente o espírito científico, que busca explicar as relações
fenomenais. Por isso é interessante outra observação de Berti: “Na Física,
Aristóteles mostra que é possível determinar as causas da natureza, e, por
conseguinte, alcançar uma ciência da natureza, que é justamente a
física”(PRADEAU, p. 48).
*12 Quando formos expor Aquino
notaremos como se lida com esses impasses óbvios à doutrina cristã.
*13 Vejam o que Berti ensina sobre: “No
tratado Sobre o céu (De caelo), Aristóteles explica que os céus são esferas
concêntricas, no centro das quais se encontra a esfera terrestre; sua matéria é
um elemento diferente dos elementos terrestres, graças ao qual eles não
conhecem nem geração nem corrupção, mas permanecem eternos: o éter” (PRADEAU,
p. 49).
Portanto, a potencialidade de
mudança está na matéria, já que o fato dos corpos celestes serem de outra
matéria é que os faz imutáveis. Ele continua a nos informar, e aqui temos o que
realmente nos importa no momento, o que é novo: “Cada céu se desloca de acordo
com um movimento circular, voltando para si mesmo e deslocando em sua rotação
os diversos planetas que estão ligados a ele. O movimento aparentemente
irregular dos planetas se explica [...] como resultado dos movimentos de grupos
de esferas, unidas por seus polos, mas girando em torno de eixos diferentes. É
preciso também acrescentar que todos os céus estão englobados numa esfera
extrema, que contém todo o universo; ela carrega em sua rotação todos os outros
céus e receberá mais tarde o nome de esfera das estrelas fixas. Cada movimento
de rotação, definido como eterno, requer necessariamente uma causa motriz que
possui em si mesma uma potência infinita, não se beneficiando de qualquer
intervenção externa, e, portanto, sendo ela própria imóvel: esta é a razão por
que existem tantos motores imóveis [...] quanto há céus. O motor imóvel da
esfera extrema é o primeiro motor imóvel; é ele que põe em movimento todo o
universo, graças à esfera das estrelas fixas” (PRADEAU, p. 48-49).
Cada céu possui planetas que
lhe são ligados. Eles se deslocam segundo suas próprias rotas particulares. Há
uniões nos polos de cada céu, mas eles têm eixos diferentes. Isso explica a
irregularidade na observação dos movimentos. Englobando todos os céus temos a
esfera maior, das estrelas fixas. Cada movimento desses céus, movimentos
eternos, possuem um motor imóvel. Portanto, cada céu possui um motor imóvel. O
céu maior, a grande esfera que engloba tudo é o motor imóvel primordia. Ele
coloca em movimento todo o universo, segundo Berti. Mas, então, ele teria que
colocar em movimento os céus menores também, não? Dessa forma, existiria apenas
um e não vários motores imóveis. Pradeau (ou Aristóteles) é muito contraditório
aqui. Berti, adiante, amplia a discussão: “...a maneira como esses motores
imóveis colocam em movimento cada esfera não é clara: a interpretação
tradicional, de acordo com a qual eles colocam em movimento porque são objetos
de amor e, portanto, de imitação, é de origem platônica. Como a única atividade
e que não implica movimento é o pensamento, os motores imóveis são substâncias
que pensam e eles são, portanto, seres vivos, eternos e completamente felizes,
em outras palavras são os deuses. O primeiro deles, ou seja, o motor das
estrelas fixas, como não tem nada acima de si em que pensar, só pensa em si
mesmo, quer dizer, ele é ‘pensamento do pensamento’. Ele é também o bem
supremo, que coloca em movimento todo o universo, tal como um general ordena um
exército, ou como um senhor organiza toda a sua casa, ou como um rei governa
seu reino” (PRADEAU, p. 53). É estranho, pois, ele parece creditar a
necessidade do movimento ao motor primeiro, que move a ‘esfera das estrelas
fixas’, e depois chama os motores das esferas ‘menores’ de motores imóveis
também. Talvez seja uma tentativa de amoldar-se ao panteísmo grego de sua
época. Não sabemos. O fato é que são concepções contraditórias. Seja como for,
ainda temos que conceber como é que o motor imóvel exerce influência sobre a
esfera das estrelas imóveis.
Além disso, quanto ao fato de
esse deus (ou deuses) ser um rei (ou reis), a provocação de Durant parece muito
pertinente de ser mencionada: “Pobre Deus aristotélico! Ele é um roi fainéant,
um rei que nada faz; ‘o rei reina mas não governa’. Não admira que os
britânicos gostem de Aristóteles; seu Deus é, obviamente, uma cópia do rei
deles” (DURANT, p. 72).
*14 Eis outra definição que Nash faz: “O
uso que Aristóteles faz da palavra alma é bem diferente do uso de Platão. [...]
Para Aristóteles, ao contrário, a alma é a forma responsável pela criatura
estar viva. Corpo e alma são dimensões diferentes da mesma substância complexa.
Para Aristóteles, a alma humana é a forma de uma substância composta; a matéria
dessa substância é o corpo humano” (NASH, p. 116).
*15 É aqui que Aristóteles postulou o
argumento do ‘terceiro homem’, que já vimos no texto sobre Platão. Cf. http://panaceiateoreferente.blogspot.com.br/2014/05/metafisica-antropologia-e-epistemologia.html.
*16 No artigo sobre o mundo das ideias
de Platão, mostramos como há boas razões, no diálogo platônico intitulado Parmênides,
para descrer no empirismo absoluto, à lá tábula rasa de John Locke, de que não
há conhecimentos inatos. Outras crítica aristotélica famosa também foi
abordada, a saber, o ‘argumento do terceiro homem’. Cf.: http://panaceiateoreferente.blogspot.com.br/2014/05/metafisica-antropologia-e-epistemologia.html
REFERÊNCIAS
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Charles. Como Ler Livros. Tradução de Edward Horst Wolff e Pedro
Sette-Câmara. São Paulo: É Realizações, 2010, 432p.
BERTI, Enrico. Aristóteles _
PRADEAU, François. História da Filosofia. Tradução de James
Bastos Arêas e Noéli Correia de Melo Sobrinho. Petrópolis: Vozes; Rio de
Janeiro: PUC-Rio. 2ª ed., 2012, 624p.
CHALITA, Gabriel. Vivendo
Filosofia. São Paulo: Atual, 2002, p. 304.
CHEUNG, Vincent. Introdução
à Teologia Sistemática. Tradução de Felipe Sabino de Araújo Neto e
Vanderson Moura da Silva. São Paulo: Arte Editorial, 2008, 328p.
CHESTERTON, G. K. Ortodoxia.
Tradução de Almiro Pisetta. São Paulo: Mundo Cristão. 2008, 264p.
CRAMPTON, W. Gary; BACON,
Richard E. Em Direção a Uma Cosmovisão Cristã. Tradução Felipe Sabino de
Araújo Neto. Brasília: Publicações Monergismo, 2009. 112p.
DURANT, Will. A
História da Filosofia. Tradução de Luiz Carlos do Nascimento Silva.
Rio de Janeiro/São Paulo: Editora Record. 4ª ed., 2001, 406p.
GAARDER, Jostein. O
mundo de Sofia: romance da história da filosofia. Tradução de João Azenha
Jr. São Paulo: Companhia das Letras, 1996. 560 p.
HODGE, Charles. Teologia
Sistemática. Tradução de Valter Graciano Martins. São Paulo:Editora Hagnos,
2001. 1777p.
NASH, Ronald H. Questões Últimas da vida: uma introdução à filosofia. Tradução de
Wadislau Martins Gomes. São Paulo: Cultura Cristã, 2008. 448 p.
SPROUL, R. C. Filosofia
para iniciantes. Tradução de Hans Udo Fuchs. São Paulo: Vida Nova, 2002,
208 p.