quarta-feira, 7 de maio de 2014

Uma breve biografia de Platão



Sproul faz uma ousada asseveração (já observada no texto sobre os sofistas): “Dois gigantes da filosofia da era pré-socrática foram Heráclito e Parmênides. Algumas pessoas dizem que toda a filosofia nada mais é que notas de rodapé ao pensamento de Platão e Aristóteles; também poderíamos dizer que Platão e Aristóteles foram apenas notas de rodapé ao pensamento de Heráclito e Parmênides” (SPROUL, p. 21). Lembramo-nos quando um amigo, filósofo, Reverendo José Carlos Piacente Jr., nos disse que compreender Parmênides e Heráclito é essencial para o entendimento dos projetos filosóficos que os sucederam. Depois de algum tempo fomos compreender o que o reverendo Piacente Jr. e Sproul queriam dizer. O grande problema da filosofia estava justamente em conciliar o imutável e eterno de nossa razão (Parmênides) com o mutável de nossos sentidos (Heráclito). Os dois pré-socráticos haviam confundido a cabeça das pessoas. Pareciam ter lançado um enigma insolúvel. Mas algumas mentes brilhantes surgiram para criar sistemas de pensamento, cosmovisões, que lidassem com esses problemas. O primeiro que iremos estudar será Platão e o próprio Sproul viria a observar isso adiante, no mesmo livro: “O paradigma de Platão tinha o propósito de resolver a tensão entre Parmênides e Heráclito, a tensão entre movimento e permanência, entre ser e vir a ser. Usando os termos hegelianos posteriores da dialética, podemos dizer que o pensamento de Herálicto (vir a ser, movimento) era uma tese, e o pensamento de Parmênides (ser, permanência) era sua antítese; Platão procurou uma síntese que explicasse tanto mudança como permanência, que incorporasse ser e vir a ser, como pólos de uma dialética que parece ser exigida por uma visão abrangente da realidade” (SPROUL, p. 35).
Antes, porém, de conhecer esse magnífico edifício filosófico, conheçamos, primeiro, o filósofo, e as tenções históricas que o levaram às reflexões que fez.

QUEM FOI PLATÃO?

                                                                 
“Platão (428? – 348? a. C.)*1  também era ateniense, filho de Aristo e Perictona, que provinham de uma antiga família pertencente à nobreza da cidade” (CHALITA, p. 52). Assim, Durant diz que “ele tinha sido criado com conforto e, talvez, em meio à riqueza” (DURANT, p. 32). Nash complementa dizendo que “seus pais eram ricos aristocratas atenienses” (NASH, p. 63). Sproul ainda traz uma informação relevante sobre Aristo, o pai de Platão: “Membro da aristocracia ateniense, o pai de Platão descendia dos primeiros reis de Atenas” (SPROUL, p. 34). Portanto, estamos falando de um mauricinho, filho de aristocratas, de descendência real.
Nash nos informa sobre seu nome: “Seu nome de nascimento foi Aristocles, e Platão parece ter sido um apelido referente à sua aparência assaz robusta” (NASH, p. 63). Segundo a descrição de Durant, ele se enquadra naqueles mauricinhos dedicados aos esportes, como os playboys americanos: “era um jovem belo e vigoroso – chamado de Platão, dizem, devido à largura dos ombros; distinguira-se como soldado e por duas vezes ganhara prêmios nos jogos ístmicos. Uma adolescência dessas não costuma produzir filósofos” (DURANT, p. 32). Sproul expressa-se um pouco diferente: “Uma tradição reza que seu nome significa ‘ombros largos’, apelido que recebeu quando jovem, por evidenciar talento como lutador” (SPROUL, p. 34). Juntando tudo temos um belo jovem, nobre, musculoso, bom soldado, bom lutador, e bom esportista. Como conclui Durant, não é do tipo que se espera grande apreço pelo saber, pela filosofia.

ELE SE ENCONTROU COM SÓCRATES, E ISSO MUDOU TUDO...


Entretanto, não era um total ignorante, um brutamontes que só pensa em seus músculos. Sproul nos informa que ele se envolveu com poesia antes de conhecer Sócrates: “Antes de conhecer Sócrates, Platão se interessava por poesia, interesse que manteve e que pode ser visto em seu estilo literário” (SPROUL, p. 34).
De repente, provavelmente na ágora, lá estava aquele baixinho um tanto quanto cheinho, de olhos esbugalhados e nariz pontudo, pulverizando a pretensa sabedoria de célebres figuras. Era, assaz, alguém interessante [caso você ainda não conheça Sócrates, clique aqui]. E o interesse de Aristocles, vulgo Platão, por aquele homem ia se intensificando gradativamente, até que se tornar seu aluno: “Platão descobrira um novo prazer no jogo ‘dialético’ de Sócrates; era uma delícia ver o mestre esvaziando dogmas e perfurando presunções com a afiada ponta de suas perguntas. Platão [...] passara do simples debate para a análise cuidadosa e a discussão proveitosa. Tornara-se um muito apaixonado amante da sabedoria e um grande admirador de seu professor” (DURANT, p. 32-33). Segundo Sproul, tornou-se aluno de Sócrates quando já contava com mais de vinte anos (SPROUL, p. 34).
Nash nos traz outra informação: “Platão mostrou pouco interesse por filosofia até a execução de Sócrates, em 399 a. C.” (NASH, p. 63). Como Nash diz que ele não estava tão interessado assim em filosofia, acreditamos que tenha se tornado um seguidor não tão dedicado, incialmente, e, com o tempo, foi sendo seduzido pelo amor à sabedoria de forma paulatina.
A morte de Sócrates repercutiu na alma de Platão. Aquele excelente homem, morto, assassinado como um criminoso! Aquilo não estava certo. “Muitos crêem que a coragem e a honra de Sócrates, demonstradas na ocasião de sua morte, afetaram enormemente Platão, resultando na busca do conhecimento filosófico de maneira semelhante à modelada por Sócrates” (NASH, p. 63-64). Gaarder tem as mesmas impressões: “Platão (427-347 a. C.) tinha vinte e nove*2 anos quando Sócrates teve de beber o cálice de cicuta. Por muito tempo ele havia sido discípulo de Sócrates e acompanhou de perto o processo movido contra seu mestre. O fato de Atenas ter condenado à morte seu filho mais nobre não só lhe deixou marcas para toda a vida como também determinou a direção de toda a sua atividade filosófica” (GAARDER, p. 96).
Chalita diz que Platão “assistiu inconformado à sentença de morte do grande mestre...” (CHALITA, p. 52). Entretanto, como observamos alhures, Platão não pôde estar presente no dia da morte do mestre, conforme nos notifica Maria Lacerda de Moura: “Ausentando-se durante esse espetáculo de beleza e grandeza ética que deve ter sido a morte serena, imperturbável, desse gênio e desse santo, enviando os seus emissários. Platão achou meio de acrescentar mais uma coroa de glórias à sua vaidade” (PLATÃO, p. 76). Alceu Amoroso Lima é ainda mais preciso para com essa informação: “Platão não pôde tampouco, acompanhar a Críton, Fédon, Apolidoro, Cebes e Símias – os cinco amigos e discípulos, fiéis que participaram do memorável encontro do último dia de Sócrates, cujo resultado Fédon, depois da morte do mestre, foi contar a Echécatres e este referiu a Platão, que por sua vez o imortalizou no diálogo que deu nome de Fédon” (PLATÃO, p. 10-11).
Ainda sobre as impressões que o assassinato da democracia a Sócrates, temos duas citações interessantes de serem feitas. Gaarder nota, de forma concisa que, “para Platão, a morte de Sócrates deixou bem clara a contradição que pode existir entre as efetivas relações dentro de uma sociedade e a verdade e o ideal” (GAARDER, p. 96). Ou seja, a política parece estar sujeita à corrupção, e não age, necessariamente, segundo o que é correto e verdadeiro. Sócrates havia demolido as acusações a ele. Mas ainda assim foi condenado. Isso levaria Platão a passar sua vida engendrando um projeto político muito definido, como nota Durant: “Aquilo o enchera de tamanho desprezo pela democracia, tamanho ódio das massas, que nem mesmo a sua linhagem e sua criação aristocráticas haviam despertado nele; levara-o a uma decisão canônica de que a democracia precisava ser destruída, para ser substituída pelo governo dos mais sábios e melhores. A preocupação da sua vida passou a ser a procura de um método pelo qual os mais sábios e melhores pudessem ser descobertos e, depois, habilitados e persuadidos a governar” (DURANT, p. 33).
Pouco depois da morte do mestre lá estava Platão publicando seu primeiro livro, como nos informa Gaarder: “A primeira ação de Platão como filósofo foi a publicação do discurso de defesa de Sócrates. Nele Platão torna público o que Sócrates havia dito ao grande júri” (GAARDER, p. 96).

O VIAJANTE


Embora Platão não estivesse sozinho com o seu desprezo à democracia, era minoria, e não era bom enfrenta-la. Platão, de destaque, podia correr risco de vida. Então “seus amigos insistiam que Atenas não era segura para ele e que aquele era um momento admiravelmente propício para que ele corresse o mundo. E assim, naquele ano de 399 a. C., ele partiu. Para onde foi, não sabemos ao certo” (DURANT, p. 33)*3. Há várias especulações, mas, como Durant é o historiador dentre nossas fontes, preferimos registrar, aqui no texto, sua hipótese: “Parece que, primeiro, foi ao Egito; e que ficou um tanto chocado ao ouvir, da classe clerical que governava aquela terra, que a Grécia era um país infame, sem tradições estabilizadoras ou uma cultura profunda e, portanto, ainda não podia ser levada a séria por aquelas enigmáticas ‘autoridades’ do Nilo. Mas nada nos ensina tanto quanto um choque; a lembrança daquela casta culta, governando teocraticamente um estático povo agrícola permaneceu viva no pensamento de Platão e representou seu papel quando ele escreveu sua Utopia. E depois, lá seguiu ele para a Sicília e para a Itália; lá, entrou durante certo tempo para a escola ou a seita que o grande Pitágoras havia fundado; e uma vez mais sua mente sensível ficou marcada pela lembrança de um pequeno grupo isolado de homens com a finalidade de ter sua erudição aproveitada e governar, vivendo uma vida simples, apesar do poder que possuía. Durante doze anos ele perambulou, bebendo avidamente sabedoria de todas as fontes, sentando-se em todos os santuários, saboreando cada credo. Há também quem diga que ele foi à Judéia, sendo influenciado, durante algum tempo, pela tradição dos profetas quase socialistas; e, até, que chegou às margens do Ganges e aprendeu as meditações místicas dos hindus. Não sabemos” (DURANT, p. 33)*4. A sua elaboração política, como apontada, seria uma abstração das coisas que vira*5.
Segundo Sproul, na Sicília Platão teve encrencas e teve de voltar para Atenas: “Durante essa viagem, diz a lenda, ele foi sequestrado, colocado à venda como escravo, resgatado por um amigo e enviado de volta a Atenas” (SPROUL, p.34). Nash refere-se à viagens à Sicília após falar da sua volta a Atenas: “Platão parece ter feito várias viagens à cidade-Estado de Sicacusa, na Sicília, em um esforço para influenciar os líderes a executar suas ideias políticas” (NASH, p. 64). Sabemos que ele se refere, pelo menos de forma inclusa, ao tempo em que Platão esteve viajando, após a morte de Sócrates, pelas informações conferidas por Luc Brisson e principalmente pela excelente ampliação fornecida pelo nosso filósofo e historiador Will Durant: “Em 387 a. C., no retorno de sua primeira viagem pela Magna Grécia (Itália do Sul) e pela Sicília – onde ele se dirigiu à corte de Denys o Antigo, tirano de Siracusa, e tomou conhecimento de Dion” (PRADEAU, p. 43) e “No ano de 387 a. C., Platão recebeu um convite de Dionísio, rei da então florescente e poderosa Siracusa, capital da Sicília, para transformar o seu reino numa Utopia [...] Mas quando Dionísio descobriu que o plano exigia que ele se tornasse um filósofo ou deixasse de ser rei, esquivou-se; o resultado foi uma áspera discussão. Segundo dizem Platão foi vendido como escravo, para ser salvo por seu amigo e discípulo Anicéris; quando os seguidores atenienses de Platão quiseram reembolsá-lo pelo resgate que pagara, ele recusou-se a receber, dizendo que eles não deveriam ser os únicos privilegiados a ajudarem a filosofia” (DURANT, p. 55). Parece que o Denys de Brisson e o Dionísio de Durant são as mesmas pessoas, ou será o tal ‘Dion’ mencionado no final da citação? O fato é que Durant nos informa com mais detalhes o que Sproul menciona no começo do parágrafo*6.
“Voltou para Atenas em 387 a. C., um homem com quarenta anos de Idade [...]. Havia perdido um pouco dos ardentes entusiasmos da juventude, mas ganhara uma perspectiva de pensamento [...]” (DURANT, p. 33). Já estava muito mais capaz de realizar seus planos e dar sucessão ao trabalho de seu mestre. “Ele tinha conhecimento e tinha arte; por exceção, o filósofo e o poeta viviam numa só alma; e ele criou para si mesmo um meio de expressão no qual a beleza e a verdade poderiam encontrar espaço e trabalhar: o diálogo” (DURANT, p. 33).

 

AS OBRAS DE PLATÃO


Falando nos diálogos, tanjamos na questão de suas obras. Alguns que lhe são atribuídos podem não ser dele, conforme expõe, dentre outras coisas, Nash: “Conquanto aproximadamente trinta e seis escritos sejam atribuídos a Platão, possivelmente seis ou sete deles são falsificações que podem ter sido escritas por alguns seguidores de Platão, da Academia. Todos os grandes escritos de Platão, incluindo Apologia, Fedon, Eutífron, Menon, A República, Timeu e As Leis, são autênticos. Os escritos mais antigos de Platão são geralmente mais curtos, concentrados em questões éticas e são inconcludentes no sentido de que eles levantam mais questões do que respostas” (NASH, p. 64).
Embora ele não tenha escrito exclusivamente diálogos, o que nos foi legado foram eles. Agora, o mais surpreendente é que, segundo Durant, eram escritos populares, versões facilitadas, divulgações de suas ideias. Dissemos surpreendente pelo fato de que são riquíssimos e, muitas vezes, difíceis de ler. Deixemos Durant falar: “Esses diálogos, segundo nos informam, foram escritos por Platão para o público leitor comum de sua época: pelo seu método coloquial, sua animada guerra de prós e contras, e seu desenvolvimento gradativo e repetição frequente de cada argumento importante, eles eram explicitamente adaptados (por obscuros que nos possam parecer agora) à compreensão do homem que deve saborear a filosofia como um luxo ocasional e que é obrigado, pela brevidade da vida, a ler como lê aquele que corre” (DURANT, p. 34).

Nash trabalha um pouco mais uma questão que já mencionamos quando dissertamos sobre Sócrates: a questão sobre Platão ter ‘adulterado’ a figura histórica de Sócrates. “O uso que Platão fez de Sócrates como interlocutor principal em muitos dos seus diálogos foi uma maneira de honrar o grande homem responsável por ele mesmo ter se tornado um filósofo. Em seus primeiros trabalhos, tais como Apologia e Críton, Platão parece apresentar uma representação fiel do método e das crenças de Sócrates. Nos escritos produzidos na sua maturidade, como Fedon, Menon e A República, Platão geralmente coloca suas próprias crenças na boca de Sócrates. Os últimos escritos de Platão ou deixam de fazer referência a Sócrates ou se utilizam dele exclusivamente como porta-voz para teorias que o Sócrates histórico jamais teve” (NASH, p. 64).

Por fim, notamos que basicamente todos os textos dos pré-socráticos foram praticamente perdidos. Sócrates não escreveu nada. Então, o que teria feito com que os escritos de Platão não tivessem se perdido? Gaarder tem a resposta: “Quanto a Platão, temos razões para crer que todas as suas obras mais importantes foram preservadas. (Além do discurso de defesa de Sócrates, Platão escreveu também uma coletânea de cartas e mais de trinta diálogos filosóficos. O número de diálogos atribuídos a Platão ainda é discutido pelos historiadores).

A ACADEMIA


“O motivo de seus escritos terem sido conservados para a posteridade pode ser atribuído também ao fato de Platão ter fundado sua própria escola de filosofia nos arredores de Atenas, num bosque que levava o nome do legendário herói grego Academos. Por causa disso, a escola de filosofia de Platão recebeu o nome de Academia”*(GAARDER, p. 96-97). Sim, a famosa Academia de Platão. Esse é o assunto desta seção.
Sproul, ao passo que Brisson concorda com Gaarder (PRADEAU, p. 43), apresenta alguns dados conflitantes com essas informações: “Aos quarenta anos fundou a Academia, pela qual ficou famoso. [...] A academia recebeu esse nome porque Platão havia obtido um pedaço de terra nos arredores de Atenas de um benfeitor chamado Academos. A Academia, situada num jardim de oliveiras, deu origem à expressão ‘os jardins de Academos’” (SPROUL, p. 34). Afinal, Academos era um herói grego ou um benfeitor do qual Platão teria obtido uma porção de terra? Seria esse bem feitor o herói grego? Infelizmente o autor deste artigo não tem, pelo menos ainda, informações mais específicas sobre o assunto.
Brisson nos informa que “A Academia [...], depois da morte de Platão, conheceu rapidamente um grande sucesso e entrou logo em conflito com a escola de Isócrates (436 – 338 a. C.), onde principalmente era ensinada a retórica” (PRADEAU, p. 43).
Para Gaarder os diálogos surgiram não apenas como idealização pedagógica, didática, de Platão. Mui provavelmente inspirado em Sócrates, a norma na Academia era o diálogo, o que influenciaria a escrita de seu fundador: “Na academia de Platão ensinavam-se filosofia, matemática e ginástica, embora ‘ensinar’ talvez não seja a melhor palavra nesse contexto. Isto porque também na academia de Platão o diálogo vivo era o que mais importava. Assim, não é por acaso que o diálogo foi a forma escolhida por Platão para registrar por escrito sua filosofia” (GAARDER, p. 97)*8.
E, falando em matemática, é interessante o que Sproul nota: “Uma placa colocada na entrada da Academia dizia: ‘Somente para geômetras’. [...] A relação com a geometria é a seguinte: tanto a matemática como a filosofia podem ser consideradas ciências formais (relativas a forma ou essência), em distinção das ciências físicas ou materiais. Platão sempre teve grande interesse pela matemática e sua relação com as formas abstratas, tema central em seu pensamento” (SPROUL, p. 34). No momento certo, a relação entre matemática (ou, mais especificamente geometria) e sua filosofia será compreendida.

ATÉ À MORTE


Na Academia Platão passou seus últimos anos de forma bem feliz. Durant nos informa como se deu sua morte: “Os últimos anos de sua longa vida devem ter sido bem felizes. Seus discípulos haviam se espalhado em todas as direções, e seu sucesso o tornara venerado em toda parte. Ele vivia em paz em sua Academia [...] seus discípulos o amavam tanto quanto ele os amava; ele era tanto amigo deles quanto seu filósofo e guia. Um de seus discípulos, enfrentando esse grande abismo chamado casamento, convidou o Mestre para a festa de suas bodas. Platão foi, rico com os seus oitenta anos, e uniu-se prazerosamente aos foliões. Mas à medida que as horas passavam em meio à alegria, o velho filósofo retirou-se para um canto tranquilo da casa e sentou-se numa cadeira para tirar uma soneca. Pela manhã, quando a festa havia terminado, os exaustos convivas foram acordá-lo. Verificaram que, durante a noite, tranquilamente, sem agitação, ele passara de um sono curto para um sono interminável. Toda Atenas o acompanhou à sepultura” (DURANT, p. 56).
Vamos, pois, conhecer as ideias desse brilhante filósofo! 
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*1 Portanto, Platão nasceu em plena Guerra do Peloponeso e viveu durante o período conturbado que se seguiu após a vitória dos espartanos.
*2 Há uma controvérsia entre a data do nascimento e morte de Platão e, claro, isso influencia as demais datas dos acontecimentos de sua vida. Gaarder aqui fala de 29 anos para Platão quando Sócrates morreu. Mas Durant fala 28 anos: “Ele estava com 28 anos quando o mestre morreu” (DURANT, p. 33). Segundo Sproul, “morreu com oitenta anos de idade” (SPROUL, p. 34).
*3 Nash parece dizer que o exílio de Platão teria sido uma iniciativa própria: “O assombro ante a execução de Sócrates também o teria levado a se exilar em Atenas por muitos anos” (NASH, p. 64). Sproul também não fala nada dessa iniciativa dos seus amigos: “Depois da morte do seu mentor, Platão deixou Atenas e foi viajar pelo mundo” (SPROUL, p. 34).
*4 Embora Nash vá fazer algumas prolepses aqui, vale a pena citá-lo para comparação: “Conquanto tenha passado muito tempo no Egito, Platão parece ter residido em colônias gregas no lugar que hoje é o sudeste da Itália. Na Itália, ele entrou em contato com a escola de pensamento conhecida como pitagorismo. Várias facetas do pitagorismo aparecem preeminentes no pensamento maduro de Platão, incluindo o dualismo mente-corpo, a imortalidade da alma e o interesse afetuoso pela matemática” (NASH, p. 63-64). Percebam que Nash apenas sumariza a exposição de Durant. Já Sproul nem mesmo menciona o Egito: “Na Sicília, conheceu os pitagóricos (seguidores de Pitágoras)” (SPROUL, p. 34).
*5 Maria Lacerda é muito semelhante a Durant em suas observações, e deixa claro que foi Dionísio quem escravizou Platão: “Pôs-se a serviço de Dionísio, tirano de Siracusa. Não entraram em acordo, com relação aos planos da realização da sua República, e diz a história que Platão foi reduzido à condição de escravo, por Dionísio, o que aliás honra Platão – que não estava disposto a se submeter à vontade do tirano. Foi salvo, resgatado pelo amigo e discípulo Anicéris” (PLATÃO, p. 72-73).
*6 Portanto, não eram idealizações, meras abstrações utópicas, como Durant observará doravante numa citação que antecipa alguns pontos que abordaremos no decorrer do artigo; que dá mais alguns detalhes de onde ele poderia ter ido e que, embora seja longa, merece ser registrada integralmente: “Esses exemplos indicam que, dentro de limites e com modificações, o plano de Platão é exequível; e realmente ele mesmo o baseara, em grande parte, na prática observada em viagens que fizera. Ele ficara impressionado com a teocracia egípcia: Ali estava uma grande e antiga civilização governada por uma pequena classe sacerdotal; e em comparação com as brigas, a tirania e a incompetência da Eclesia ateniense, Platão achou que o governo egípcio representava uma forma de Estado muito mais elevada (Leis, 819). Na Itália, ele ficara algum tempo com uma comunidade pitagórica, vegetariana e comunista, que durante gerações havia controlado a colônia grega na qual vivia. Em Esparta, havia visto uma pequena classe governante levando uma vida dura e simples em comum, em meio a uma população submissa; comendo juntos, restringindo as uniões sexuais para fins eugênicos e dando aos bravos o privilégio de várias mulheres. Sem dúvida, ouvira Eurípides defender uma comunidade de esposas, a liberação dos escravos e a pacificação do mundo grego por uma liga helênica (Média, 230, Fragm., 655); sem dúvida, também, conhecera alguns dos cínicos que haviam criado um forte movimento comunista entre o que agora chamaríamos de Esquerda Socrática. Em suma, Platão deve ter sentido que, ao propor seu plano, não estava fazendo uma melhoria impossível das realidades que seus olhos haviam contemplado” (DURANT, p. 52).
*7 “Durante quase um milênio, os textos de Platão foram lidos, recopiados, meditados e cuidadosamente transmitidos por pessoas de alta cultura; é isto que explica a excepcional qualidade dos nossos manuscritos dos diálogos e a imensa difusão do pensamento platônico” (PRADEAU, p. 43).
*8 “...para Platão, talvez a conversa a respeito de assuntos filosóficos seja a mais importante de todas as atividades humanas. Essa ideia raramente é explicitada nos diálogos, ainda que Sócrates talvez a esteja propondo quando, na Apologia, diz que a vida não examinada não vale a pena ser vivida, e Platão a menciona na Carta Sete” (ADLER, p. 292-293). Dessa forma, parece que Sócrates, o que concorda Platão, entendia que a reflexão filosófica deveria fazer parte do diálogo das pessoas, e assim tenha emoldurado seu projeto filosófico.

REFERÊNCIAS

BRISSON, Luc. Platão_ PRADEAU, François. História da Filosofia. Tradução de James Bastos Arêas e Noéli Correia de Melo Sobrinho. Petrópolis: Vozes; Rio de Janeiro: PUC-Rio. 2ª ed., 2012, 624p.

CHALITA, Gabriel. Vivendo  Filosofia. São Paulo: Atual, 2002, p. 304.

DURANT, Will. A História da Filosofia. Tradução de Luiz Carlos do Nascimento Silva. Rio de Janeiro/São Paulo: Editora Record. 4ª ed., 2001, 406p.

GAARDER, Jostein. O mundo de Sofia: romance da história da filosofia. Tradução de João Azenha Jr. São Paulo: Companhia das Letras, 1996. 560 p.

NASH, Ronald H. Questões Últimas da vida: uma introdução à filosofia. Tradução de Wadislau Martins Gomes. São Paulo: Cultura Cristã, 2008. 448 p.

PLATÃO. Apologia de Sócrates. Tradução e Apêndice de Maria Lacerda de Moura; Introdução de Alceu Amoroso Lima. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2011, 88p.


SPROUL, R. C. Filosofia para iniciantes. Tradução de Hans Udo Fuchs. São Paulo: Vida Nova, 2002, 208 p.

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